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sábado, 28 de agosto de 2010
A Sociedade de Norbert Elias: Seminário Apresentado
REFLEXÕES SOBRE A RELAÇÃO INDIVÍDUO-SOCIEDADE:
A CONTRIBUIÇÃO DE NORBERT ELIAS.
(Silva, Miriam Fialho)
INTRODUÇÃO
Tratar da teoria sociológica e dos novos rumos que lhe são necessários darem, constitui-se, hoje, numa tarefa apaixonante. Estudiosos ao longo desses últimos 50 anos buscam encontrar o fio condutor rumo a construção de explicações que apontem caminhos à teoria sociológica, na intenção de dar por terminado um ciclo social e abrir outro que deverá ser fundado a partir do “novo”. Cabe questionar o que na verdade é mesmo o novo? E se o que se chama atualmente de novo já não é, ao mesmo tempo, velho?
Numa primeira instância, pode-se dizer que o surgimento de uma teoria sugere sempre o novo. No entanto, partindo do pressuposto de que a teoria não nasce do nada, mas são construções resultantes de processos de estudos e pesquisas no plano empírico e teórico que sempre se reportam ao que já foi produzido, poderíamos afirmar que os modelos teóricos já existentes são a sustentação necessária à construção de novos modelos. Segundo Durkheim (1985:112), “quando uma ciência está nascendo, somos realmente obrigados, para construí-la, a nos referir aos únicos modelos que existem, isto é, às ciências já formadas. Encerram estas um tesouro de experiências já completas que seria insensato não aproveitarem”
Sendo assim, as teorias se constroem a partir das que já existem e vão sendo validadas em seus modelos próprios por meio de um processo gradativo, quando novos paradigmas são criados, dando novas explicações, melhores e mais gerais aos temas em estudo.
No que diz respeito, especificamente, a teoria sociológica, faz-se necessário tratá-la de modo diferenciado das demais teorias, quanto aos seus paradigmas. Isto porque ela não é uma teoria sociológica única, visto que está construída sob as explicações de três paradigmas antagônicos entre si. Mesmo havendo certas similaridades entre os três paradigmas, eles partem de afirmações dissemelhantes e propõem análises sob bases ideológicas bem distintas.
Esses paradigmas aparecem no pensamento clássico-século XIX e início do XX-, e possuem como seus expoentes os teóricos: Durkheim, Marx e Weber.
O peso das construções teórico-metodológicas desses três grandes expoentes é muito grande, o que se explica pelo modo como essa tríade construiu a sua produção científica e propôs os modelos e as análises explicativas da realidade social, num período em que se dava por encerrado um ciclo da sociedade: final da Idade Média-superação do feudalismo-, e início da Idade Moderna-início da grande era industrial e do racionalismo, iluminismo-.
Esse período está configurado no desencantamento da sociedade face aos rumos que os movimentos sociais tomaram, a partir da possibilidade de um viver racional, bem como dos desdobramentos que a ciência teve de fazer para dar conta da nova realidade. Novas explicações, modelos e leis baseadas em métodos científicos universais, estavam sendo postas em discussão nas várias instâncias da sociedade, sustentados nos princípios do conhecimento elaborado nos princípios novos da razão iluminista.
Nesse cenário, inscrevem-se nossos teóricos da sociologia, configurados em atores sociais, empenhados na construção dos paradigmas para dar conta das explicações da nova realidade social que emergia à época.
A sociologia vive, hoje, um novo momento na busca de explicações sobre a sociedade. Explicar os “fatos sociais como coisas”, como propôs Durkheim (1985); ou explicar as sociedades como sociedades construídas como “tipos ideais”, como o fez Weber (1987); ou ainda a partir do movimento operário que conclamava o povo a se unir numa só voz contra a burguesia e o capitalismo, como o fez Marx no seu Manifesto do Partido Comunista (1986), conquanto ainda de muito valor, não dão mais conta da complexidade da sociedade, especialmente no que se refere as ações dos indivíduos e as suas relações sociais.
O interesse investigatório da teoria sociológica na atualidade são as construções práticas, que se expressão como produtos da atividade contínua do homem, centrando sua abordagem na interioridade de ser genérico e nas formas diferenciadas de expressão tanto individual, quanto coletiva, em sistemas micro-sociais.
Diversos atores sociais e escolas emergem na abertura dessa nova perspectiva da teoria sociológica e, nesse parecer, levantam-se questões que ainda não se sabe como serão solucionadas. Questões de matizes múltiplas, tais como: Como deve ser a teoria sociológica desse tempo? Ou, como fazer para a construção de uma nova teoria sociológica, tratando-se com a grande adversidade da modernidade e da perspectiva da pós-modernidade? Ou, ainda, qual o modelo, o método e as leis, que deverão pautar, explicar e validar a nova teoria?
Estas são algumas, do grande elenco de questões, que afloram no trato dessa temática. Aqui não discutimos nenhuma delas. Ficarão apenas como idéias provocativas e reveladoras do debate atual, apontando caminhos para uma futura discussão.
No momento, centramos nossa discussão na retomada das idéias propostas por Norbert Elias (1994), acerca do tema: A Sociedade dos Indivíduos (Parte I e II), em função de dois aspectos principais: 1. por considerarmos bastante significativa a contribuição deste autor para a discussão de um novo enfoque que vem se fortalecendo dentro da teoria sociológica, na atualidade, contemplando, pois, uma nova abordagem paradigmática, e 2. Em função da exigência e necessidade acadêmica de promover uma articulação permanente entre os conteúdos trabalhados nas disciplinas cursadas e nosso interesse de pesquisa individual, cujo cerne se encontra no problema relativo aos reflexos da coletividade na vida individual das pessoas e nos modos como elas desenvolvem suas vivências.
Buscando contemplar nosso objetivo, apresentamos nossas reflexões subdivididas em quatro ítens: 1. A sociedade dos indivíduos e as suas configurações; 2. O problema da relação entre o todo e as partes; 3. Os problemas da autoconsciência; 4. Como se inscrevem no contexto da sociedade as pessoas portadoras do HIV-AIDS.
1. A SOIEDADE DOS INDIVÍDUOS
A obra pioneira de Elias busca explicar a relação existente entre a pluralidade de pessoas e a pessoa singular, a que chamamos “indivíduo”, e a da pessoa singular com a pluralidade.
Elias inicia a sua abordagem numa linguagem dialogal, procurando definir o termo sociedade. Segundo ele, todos sabem o que alguém quer dizer quando usa a palavra “sociedade”. A palavra é do conhecimento de todos, tramita no meio das pessoas como uma moeda, passando de uma pessoa a outra, e o seu valor já é conhecido por todos, por isso não há necessidade de testar o seu conteúdo.
O autor conceitua sociedade como sendo uma porção de pessoas juntas, que em localidades diferentes formam tipos de sociedade diferentes. Essa sociedade composta de muitas pessoas individuais, não foi planejada por ninguém e só existe porque existe um grande número de pessoas, e só continua funcionando porque as pessoas vivem e a fazem funcionar.
Na explicação dada pelo autor quanto ao que é plural e o que é singular, nós temos o seguinte: o ser humano singular existe isoladamente, fora de uma entidade, é o “indivíduo”. Enquanto que o plural é a “sociedade”. Esta oscila entre duas idéias opostas mas igualmente enganosas: sociedade compreendida como uma mera acumulação, coletânea somatória e desestruturada de muitas pessoas individuais, ou como objeto que existe para além dos indivíduos. Nesse parecer, Elias diz que as palavras, pensamentos e atos das pessoas que crescem na esfera da sociedade, levam a que o ser humano singular rotulado de indivíduo, e a pluralidade das pessoas concebidas como sociedade, pareçam ser duas entidades ontologicamente diferentes. Ao que parece, esse trabalho de Elias se refere aos conceitos de “indivíduo”e “sociedade”em sua forma atual, o que talvez seja muito útil para nos emanciparmos do uso mais antigo e familiar que, muitas vezes, leva os dois termos a parecerem simples opostos.
No que é possível observar, o objetivo do autor é, pois, libertar o pensamento da compulsão de compreender os dois termos dessa maneira. Segundo ele, é possível alcançar isso quando a mera crítica negativa desse conceito é ultrapassada e se estabelece um novo modelo de explicação acerca da maneira como os seres humanos individuais ligam-se, uns aos outros, numa pluralidade, ou seja, numa sociedade.
Na construção do seu texto, Elias parte para algumas análises epistemológicas, tentando encontrar o fio condutor para responder as suas questões. Segundo ele, faltam-nos modelos conceituais e uma visão global face aos quais possamos tornar compreensível, no pensamento, aquilo que vivenciamos diariamente na realidade. E, assim, possamos compreender de que modo um grande número de indivíduos compõem, entre si, algo maior e diferente de uma coleção de indivíduos isolados. Como é que eles formam uma “sociedade” e como ocorre para que essa sociedade possa se modificar de maneira específica, tendo uma história que segue um curso não pretendido ou planejado por qualquer dos indivíduos que a compõe.
Outros pontos enfocados pelo autor tratam da formação cultural dos indivíduos. Ele diz que a maioria das pessoas, parte consciente e parte inconscientemente, conservam, ainda hoje, um mito peculiar de criação. Ele trata do processo de aculturação pelo qual a criança passa desde seu nascimento, e do papel que a sociedade desempenha nesse processo. Aborda questões da formação bio-psíquica social e cultural desde a infância, bem como da relação de parentesco que, segundo ele, são determinadas pela sociedade. Destaca a questão da linguagem como responsável pela comunicação social entre as pessoas. Segundo Elias, se não houver um processo de evolução cultural, onde a criança fará a assimilação de modelos sociais previamente formados e sem a moldagem de suas funções psíquicas, a criança continua a ser pouco mais que um animal. Por isso, ela necessita da sociedade, de sua modelagem social para, então, poder se transformar num ser mais individualizado e complexo.
2. O PROBLEMA DA RELAÇÃO ENTRE O TODO E AS PARTES
Na sua abordagem Elias trata da questão do todo e das partes, buscando, para essa discussão, dois exemplos: Aristóteles -a relação entre as pedras- e a Gestalt -o todo é diferente da soma de suas partes-. Segundo a Gestalt o todo incorpora leis de um tipo especial, as quais não podem ser elucidadas pelo exame de elementos isolados. No exemplo de Aristóteles, afirma-se que as pedras talhadas e encaixadas para compor uma casa não passam de um meio; a casa é o fim.
Seremos, também nós, como seres humanos individuais, não mais que um meio que vive e ama, luta e morrem, em prol do todo social? Elias diz que essa pergunta leva-nos a um debate cujos meandros e reviravoltas nos são mais do que conhecidos.
A relação entre as partes e o todo é vista como uma forma específica de relacionamento. Em certas condições pode ser vinculada à relação entre os meios e os fins. “A afirmação de que o “indivíduo” é parte de um todo maior que ele forma junto com outros” não diz muita coisa, é até banal porque é evidente.
Uma das grandes controvérsias de nossa época desenrola-se, justamente, entre os que afirmam que a sociedade, em suas diferentes manifestações -a divisão do trabalho, a organização do Estado-, é apenas um “meio, consistindo o “fim” no bem-estar dos indivíduos, e os que asseveram que o bem-estar dos indivíduos é menos “importante” que a manutenção da unidade social da qual o indivíduo faz parte, constituindo esta o “fim” propriamente dito da vida individual.
Segundo Elias, nós somos na vida social de hoje, incessantemente confrontados pela questão de se, e como é possível criar uma ordem social que permita uma melhor humanização entre as necessidades pessoais dos indivíduos, de um lado, e as exigências feitas a cada indivíduo pelo trabalho cooperativo de muitos, pela manutenção e eficiência do todo social, de outro,
Segundo o autor, seria necessário desenvolver a sociedade de modo que não apenas alguns, mas a totalidade de seus membros tivesse a oportunidade dessa harmonia. Porém, ele diz que quando pensa com calma sobre o assunto, ficam evidentes que as duas coisas só são possíveis juntas: só pode haver uma vida comunitária mais livre de perturbações e tensões se todos os indivíduos, dentro dela, gozarem de satisfação suficiente; e só pode haver uma existência individual mais satisfatória se a estrutura social pertinente for mais livre de tensão, perturbação e conflitos. O que para ele é quase impossível.
3. OS PROBLEMAS DA AUTOCONSCIÊNCIA
O texto de Elias é bastante denso. Pode-se dizer que ele se configura numa análise detalhada do indivíduo e da sociedade, e das configurações que os indivíduos assumem, enfocada nas seguintes perspectivas: definição de indivíduo-pessoa singular; definição de sociedade - pluralidade de indivíduos-, e definição de sociedade dos indivíduos-afiguração das pessoas, ou seja, aquilo que as pessoas desempenham, ou representam na pluralidade, sem perder a sua consciência própria de indivíduo. Configura-se, também, numa análise detalhada dos processos de autopercepçao e individualidade, bem como da pressão exercida sobre esses indivíduos -“rede humana”-. Configura-se, também, numa discussão das formações bio-psíquicas do indivíduo, analisando a formação da personalidade na perspectiva da teoria psicanalista: Ego, Superego e Id. E, finalmente, trata de analisar as configurações várias que os indivíduos representam enquanto seres humanos integrantes de uma ordem social. Elias aborda, ainda, problemas da autoconsciência. Nesse aspecto, enfoca a fase da maturidade do indivíduo, na qual eles rompem com os seus grupos pré-estatais, que são estreitamente aparentados, e partem para outras vivências em sociedade maiores e mais complexas para fazerem outras opções.
Nesse trato, ele define a existência de dois tipos de sociedade: uma simples e outra complexa. Elias diz que as sociedades se tornam mais complexas e mais centralizadas quando a especialização aumenta e se diversificam as oportunidades oferecidas pela sociedade. As sociedades a medida que se tornam mais complexas vão abrindo maiores espaços para os indivíduos.
Essa parte do texto de Elias é bastante interessante. Nessa abordagem, ele toma a sociedade que evoluiu de simples para complexa e analisa o indivíduo como um ser adulto, que adentrou numa nova realidade de vida em sociedade e que passa a pertencer à outra configuração básica de vivência com grupos sociais. Segundo o autor, nas comunidades mais primitivas e unidas há a presença constante do outro fazendo o controle social, enquanto qua nas sociedades complexas, industrializadas, urbanizadas e densamente habitadas os adultos têm muito mais oportunidades, porém são acometidos de grande solidão. Mas, como é possível correr riscos, eles se orgulham das suas escolhas, da sua independência. Essas pessoas sofrem mudanças mentais significativas.
Elias considera a sociedade complexa como algo que é muito promissor aos indivíduos e ao mesmo tempo é angustiante. Segundo ele, o elevado nível de individualização ou independência pessoal, e não a solidão, característico desse tipo de sociedade, muitas vezes não se harmoniza com a complexa rede de dependência em que a pessoa se vê encerrada, decorrente de necessidades socialmente inculcadas. Segundo ele, essa trama de independência e dependência, de necessidade e capacidade de decidir sozinho, por um lado, e de impossibilidade de decidir sozinho, por outro, de responsabilidade por si e obediência ao Estado pode produzir tensões consideráveis.
Ao que nos parece, no que Elias aborda, os indivíduos sofrem um impasse: sentem a necessidade de se destacar e ao mesmo tempo de fazer parte. Segundo ele, o sentimento de participar, de estar envolvido, muitas vezes se mistura com o de estar descomprometido, desligado.
Ninguém sabe ao certo como conduzir-se diante de tal realidade. Por esse motivo, Elias acha necessário investigar esses problemas à luz das ciências humanas.
4. COMO SE INSCREVEM NO CONTEXTO DA SOCIEDADE AS PESSOAS PORTADORAS DO HIV/AIDS
Trazer à discussão dentro deste ensaio, o tema de nossa pesquisa é bastante significativo para nós, especialmente porque iremos tratar com questões acerca da relação entre indivíduo e sociedade. No caso específico, com pessoas portadoras de HIV-AIDS. A AIDS se configura, na contemporaneidade, como um grande flagrante na sociedade. Seu advento traz embutidas questões de teor diverso, denunciadoras do modus vivendis das populações, tais como: formas de organização social; construção, compreensão e representações da realidade social empírica; redimensionamento das práticas de vida, a partir das leituras e apropriações dos textos com os quais vão se deparando na sua cotidianidade e reordenamento das vivências, e, principalmente, um redimensionamento da relação entre o singular -o indivíduo- e o plural-a sociedade-, para usar termos de Elias (1994).
As particularidades das vivências das pessoas a que estamos nos referindo, materializam-se na cotidianidade de forma contundente e são cristalizadas pelos tipos de vida e pelos modos como elas se inscrevem nos campos sociais: grupos de pertença, lugares que conhecem e passeiam hábitos de vida diferenciados, e outros.
Neste sentido, a contribuição pretendida no estudo que realizaremos não está diretamente voltada para o estudo etiológico do vírus HIV, mas se funda e justifica na tentativa de definir, através da pesquisa científica, o perfil das pessoas portadoras e doentes de HIV-AIDS, a partir do modo como elas se redefinem individual e coletivamente nos vários campos sociais nos quais estão inseridas, após a sua nova condição de vida. E, ainda, na tentativa de precisar as formas como lidam com essa nova realidade e constroem, se o fazem, novas representações sociais e imaginárias, tanto sobre o próprio fenômeno HIV-AIDS, quanto sobre a sua vida pessoal, na sexualidade, no seu grupo familiar, no seu trabalho e na religião.
Dar um novo sentido a vida é a necessidade com a qual todos se deparam. Sentimentos de ordens diversas emergem, os laços sociais são estremecidos, os laços afetivos se quebram, ou se fortalecem. A crise de solidão é intensa, e como conseqüência nasce à insegurança quanto ao futuro. É justamente a partir desse estágio que nasce a necessidade de uma redefinição das instâncias identitárias: no plano individual e no plano da coletividade, novas representações sociais e imaginárias nascerão desse momento.
Conclusão
A discussão sobre as proposições de Elias apresentadas neste trabalho, apesar de bastante sintéticas, revela o quanto elucidativa pode se constituir para a pesquisa que pretendemos desenvolver, como indica a breve discussão elaborada no item 4.
Estas proposições dizem respeito, principalmente, a discussão sobre as tensões produzidas na trama entre a independência e dependência, a necessidade e capacidade de decidir sozinho, por um lado, e de impossibilidade de decidir, por outro, que tão bem materializam os conflitos entre o indivíduo e o seu contexto social, e que se apresentam de maneira radical entre as pessoas portadoras de HIV-AIDS, aspectos importantes que se constituíram em objeto de aprofundamento de análises posteriores.
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BIBLIOGRAFIA
1. CAMARGO, A.M.F. A AIDS na Sociedade Contemporânea. Estudos e Histórias
De Vida. São Paulo, Letras e Letras, 1994.
2. DICIONÁRIO DO PENSAMENTO SOCIAL DO SÉCULO XX. Rio de Janeiro,
Zahar, 1996.
3. DURKHEIM, E. As Regras do Método Sociológico. São Paulo, Companhia Editora
Nacional, 1985.
4. ELIAS, N. La Soledad de los Moribundos. México, Fundo de Cultura Econômica,
1982.
5. ________. A Sociedade dos Indivíduos. Rio de Janeiro, Zahar, 1994.
6. GIDDENS, A. Novas Regras do Método Sociológico. Rio de Janeiro, Zahar, 1978.
7. ___________. A Transformação da Intimidade. São Paulo, UNESP, 1992.
8. MARX, K. E ENGELS, F. Manifesto do Partido Comunista. São Paulo, Global
Editora, 1986.
9. PAIVA, V. (Org.) Em Tempos de AIDS. São Paulo, Sumus Editorial Ltda, 1992.
10. WEBER, M. A Ética Protestante e o Espírito do Capitalismo. São Paulo, Biblioteca Pioneira de Ciências Sociais, 1987.
A CONTRIBUIÇÃO DE NORBERT ELIAS.
(Silva, Miriam Fialho)
INTRODUÇÃO
Tratar da teoria sociológica e dos novos rumos que lhe são necessários darem, constitui-se, hoje, numa tarefa apaixonante. Estudiosos ao longo desses últimos 50 anos buscam encontrar o fio condutor rumo a construção de explicações que apontem caminhos à teoria sociológica, na intenção de dar por terminado um ciclo social e abrir outro que deverá ser fundado a partir do “novo”. Cabe questionar o que na verdade é mesmo o novo? E se o que se chama atualmente de novo já não é, ao mesmo tempo, velho?
Numa primeira instância, pode-se dizer que o surgimento de uma teoria sugere sempre o novo. No entanto, partindo do pressuposto de que a teoria não nasce do nada, mas são construções resultantes de processos de estudos e pesquisas no plano empírico e teórico que sempre se reportam ao que já foi produzido, poderíamos afirmar que os modelos teóricos já existentes são a sustentação necessária à construção de novos modelos. Segundo Durkheim (1985:112), “quando uma ciência está nascendo, somos realmente obrigados, para construí-la, a nos referir aos únicos modelos que existem, isto é, às ciências já formadas. Encerram estas um tesouro de experiências já completas que seria insensato não aproveitarem”
Sendo assim, as teorias se constroem a partir das que já existem e vão sendo validadas em seus modelos próprios por meio de um processo gradativo, quando novos paradigmas são criados, dando novas explicações, melhores e mais gerais aos temas em estudo.
No que diz respeito, especificamente, a teoria sociológica, faz-se necessário tratá-la de modo diferenciado das demais teorias, quanto aos seus paradigmas. Isto porque ela não é uma teoria sociológica única, visto que está construída sob as explicações de três paradigmas antagônicos entre si. Mesmo havendo certas similaridades entre os três paradigmas, eles partem de afirmações dissemelhantes e propõem análises sob bases ideológicas bem distintas.
Esses paradigmas aparecem no pensamento clássico-século XIX e início do XX-, e possuem como seus expoentes os teóricos: Durkheim, Marx e Weber.
O peso das construções teórico-metodológicas desses três grandes expoentes é muito grande, o que se explica pelo modo como essa tríade construiu a sua produção científica e propôs os modelos e as análises explicativas da realidade social, num período em que se dava por encerrado um ciclo da sociedade: final da Idade Média-superação do feudalismo-, e início da Idade Moderna-início da grande era industrial e do racionalismo, iluminismo-.
Esse período está configurado no desencantamento da sociedade face aos rumos que os movimentos sociais tomaram, a partir da possibilidade de um viver racional, bem como dos desdobramentos que a ciência teve de fazer para dar conta da nova realidade. Novas explicações, modelos e leis baseadas em métodos científicos universais, estavam sendo postas em discussão nas várias instâncias da sociedade, sustentados nos princípios do conhecimento elaborado nos princípios novos da razão iluminista.
Nesse cenário, inscrevem-se nossos teóricos da sociologia, configurados em atores sociais, empenhados na construção dos paradigmas para dar conta das explicações da nova realidade social que emergia à época.
A sociologia vive, hoje, um novo momento na busca de explicações sobre a sociedade. Explicar os “fatos sociais como coisas”, como propôs Durkheim (1985); ou explicar as sociedades como sociedades construídas como “tipos ideais”, como o fez Weber (1987); ou ainda a partir do movimento operário que conclamava o povo a se unir numa só voz contra a burguesia e o capitalismo, como o fez Marx no seu Manifesto do Partido Comunista (1986), conquanto ainda de muito valor, não dão mais conta da complexidade da sociedade, especialmente no que se refere as ações dos indivíduos e as suas relações sociais.
O interesse investigatório da teoria sociológica na atualidade são as construções práticas, que se expressão como produtos da atividade contínua do homem, centrando sua abordagem na interioridade de ser genérico e nas formas diferenciadas de expressão tanto individual, quanto coletiva, em sistemas micro-sociais.
Diversos atores sociais e escolas emergem na abertura dessa nova perspectiva da teoria sociológica e, nesse parecer, levantam-se questões que ainda não se sabe como serão solucionadas. Questões de matizes múltiplas, tais como: Como deve ser a teoria sociológica desse tempo? Ou, como fazer para a construção de uma nova teoria sociológica, tratando-se com a grande adversidade da modernidade e da perspectiva da pós-modernidade? Ou, ainda, qual o modelo, o método e as leis, que deverão pautar, explicar e validar a nova teoria?
Estas são algumas, do grande elenco de questões, que afloram no trato dessa temática. Aqui não discutimos nenhuma delas. Ficarão apenas como idéias provocativas e reveladoras do debate atual, apontando caminhos para uma futura discussão.
No momento, centramos nossa discussão na retomada das idéias propostas por Norbert Elias (1994), acerca do tema: A Sociedade dos Indivíduos (Parte I e II), em função de dois aspectos principais: 1. por considerarmos bastante significativa a contribuição deste autor para a discussão de um novo enfoque que vem se fortalecendo dentro da teoria sociológica, na atualidade, contemplando, pois, uma nova abordagem paradigmática, e 2. Em função da exigência e necessidade acadêmica de promover uma articulação permanente entre os conteúdos trabalhados nas disciplinas cursadas e nosso interesse de pesquisa individual, cujo cerne se encontra no problema relativo aos reflexos da coletividade na vida individual das pessoas e nos modos como elas desenvolvem suas vivências.
Buscando contemplar nosso objetivo, apresentamos nossas reflexões subdivididas em quatro ítens: 1. A sociedade dos indivíduos e as suas configurações; 2. O problema da relação entre o todo e as partes; 3. Os problemas da autoconsciência; 4. Como se inscrevem no contexto da sociedade as pessoas portadoras do HIV-AIDS.
1. A SOIEDADE DOS INDIVÍDUOS
A obra pioneira de Elias busca explicar a relação existente entre a pluralidade de pessoas e a pessoa singular, a que chamamos “indivíduo”, e a da pessoa singular com a pluralidade.
Elias inicia a sua abordagem numa linguagem dialogal, procurando definir o termo sociedade. Segundo ele, todos sabem o que alguém quer dizer quando usa a palavra “sociedade”. A palavra é do conhecimento de todos, tramita no meio das pessoas como uma moeda, passando de uma pessoa a outra, e o seu valor já é conhecido por todos, por isso não há necessidade de testar o seu conteúdo.
O autor conceitua sociedade como sendo uma porção de pessoas juntas, que em localidades diferentes formam tipos de sociedade diferentes. Essa sociedade composta de muitas pessoas individuais, não foi planejada por ninguém e só existe porque existe um grande número de pessoas, e só continua funcionando porque as pessoas vivem e a fazem funcionar.
Na explicação dada pelo autor quanto ao que é plural e o que é singular, nós temos o seguinte: o ser humano singular existe isoladamente, fora de uma entidade, é o “indivíduo”. Enquanto que o plural é a “sociedade”. Esta oscila entre duas idéias opostas mas igualmente enganosas: sociedade compreendida como uma mera acumulação, coletânea somatória e desestruturada de muitas pessoas individuais, ou como objeto que existe para além dos indivíduos. Nesse parecer, Elias diz que as palavras, pensamentos e atos das pessoas que crescem na esfera da sociedade, levam a que o ser humano singular rotulado de indivíduo, e a pluralidade das pessoas concebidas como sociedade, pareçam ser duas entidades ontologicamente diferentes. Ao que parece, esse trabalho de Elias se refere aos conceitos de “indivíduo”e “sociedade”em sua forma atual, o que talvez seja muito útil para nos emanciparmos do uso mais antigo e familiar que, muitas vezes, leva os dois termos a parecerem simples opostos.
No que é possível observar, o objetivo do autor é, pois, libertar o pensamento da compulsão de compreender os dois termos dessa maneira. Segundo ele, é possível alcançar isso quando a mera crítica negativa desse conceito é ultrapassada e se estabelece um novo modelo de explicação acerca da maneira como os seres humanos individuais ligam-se, uns aos outros, numa pluralidade, ou seja, numa sociedade.
Na construção do seu texto, Elias parte para algumas análises epistemológicas, tentando encontrar o fio condutor para responder as suas questões. Segundo ele, faltam-nos modelos conceituais e uma visão global face aos quais possamos tornar compreensível, no pensamento, aquilo que vivenciamos diariamente na realidade. E, assim, possamos compreender de que modo um grande número de indivíduos compõem, entre si, algo maior e diferente de uma coleção de indivíduos isolados. Como é que eles formam uma “sociedade” e como ocorre para que essa sociedade possa se modificar de maneira específica, tendo uma história que segue um curso não pretendido ou planejado por qualquer dos indivíduos que a compõe.
Outros pontos enfocados pelo autor tratam da formação cultural dos indivíduos. Ele diz que a maioria das pessoas, parte consciente e parte inconscientemente, conservam, ainda hoje, um mito peculiar de criação. Ele trata do processo de aculturação pelo qual a criança passa desde seu nascimento, e do papel que a sociedade desempenha nesse processo. Aborda questões da formação bio-psíquica social e cultural desde a infância, bem como da relação de parentesco que, segundo ele, são determinadas pela sociedade. Destaca a questão da linguagem como responsável pela comunicação social entre as pessoas. Segundo Elias, se não houver um processo de evolução cultural, onde a criança fará a assimilação de modelos sociais previamente formados e sem a moldagem de suas funções psíquicas, a criança continua a ser pouco mais que um animal. Por isso, ela necessita da sociedade, de sua modelagem social para, então, poder se transformar num ser mais individualizado e complexo.
2. O PROBLEMA DA RELAÇÃO ENTRE O TODO E AS PARTES
Na sua abordagem Elias trata da questão do todo e das partes, buscando, para essa discussão, dois exemplos: Aristóteles -a relação entre as pedras- e a Gestalt -o todo é diferente da soma de suas partes-. Segundo a Gestalt o todo incorpora leis de um tipo especial, as quais não podem ser elucidadas pelo exame de elementos isolados. No exemplo de Aristóteles, afirma-se que as pedras talhadas e encaixadas para compor uma casa não passam de um meio; a casa é o fim.
Seremos, também nós, como seres humanos individuais, não mais que um meio que vive e ama, luta e morrem, em prol do todo social? Elias diz que essa pergunta leva-nos a um debate cujos meandros e reviravoltas nos são mais do que conhecidos.
A relação entre as partes e o todo é vista como uma forma específica de relacionamento. Em certas condições pode ser vinculada à relação entre os meios e os fins. “A afirmação de que o “indivíduo” é parte de um todo maior que ele forma junto com outros” não diz muita coisa, é até banal porque é evidente.
Uma das grandes controvérsias de nossa época desenrola-se, justamente, entre os que afirmam que a sociedade, em suas diferentes manifestações -a divisão do trabalho, a organização do Estado-, é apenas um “meio, consistindo o “fim” no bem-estar dos indivíduos, e os que asseveram que o bem-estar dos indivíduos é menos “importante” que a manutenção da unidade social da qual o indivíduo faz parte, constituindo esta o “fim” propriamente dito da vida individual.
Segundo Elias, nós somos na vida social de hoje, incessantemente confrontados pela questão de se, e como é possível criar uma ordem social que permita uma melhor humanização entre as necessidades pessoais dos indivíduos, de um lado, e as exigências feitas a cada indivíduo pelo trabalho cooperativo de muitos, pela manutenção e eficiência do todo social, de outro,
Segundo o autor, seria necessário desenvolver a sociedade de modo que não apenas alguns, mas a totalidade de seus membros tivesse a oportunidade dessa harmonia. Porém, ele diz que quando pensa com calma sobre o assunto, ficam evidentes que as duas coisas só são possíveis juntas: só pode haver uma vida comunitária mais livre de perturbações e tensões se todos os indivíduos, dentro dela, gozarem de satisfação suficiente; e só pode haver uma existência individual mais satisfatória se a estrutura social pertinente for mais livre de tensão, perturbação e conflitos. O que para ele é quase impossível.
3. OS PROBLEMAS DA AUTOCONSCIÊNCIA
O texto de Elias é bastante denso. Pode-se dizer que ele se configura numa análise detalhada do indivíduo e da sociedade, e das configurações que os indivíduos assumem, enfocada nas seguintes perspectivas: definição de indivíduo-pessoa singular; definição de sociedade - pluralidade de indivíduos-, e definição de sociedade dos indivíduos-afiguração das pessoas, ou seja, aquilo que as pessoas desempenham, ou representam na pluralidade, sem perder a sua consciência própria de indivíduo. Configura-se, também, numa análise detalhada dos processos de autopercepçao e individualidade, bem como da pressão exercida sobre esses indivíduos -“rede humana”-. Configura-se, também, numa discussão das formações bio-psíquicas do indivíduo, analisando a formação da personalidade na perspectiva da teoria psicanalista: Ego, Superego e Id. E, finalmente, trata de analisar as configurações várias que os indivíduos representam enquanto seres humanos integrantes de uma ordem social. Elias aborda, ainda, problemas da autoconsciência. Nesse aspecto, enfoca a fase da maturidade do indivíduo, na qual eles rompem com os seus grupos pré-estatais, que são estreitamente aparentados, e partem para outras vivências em sociedade maiores e mais complexas para fazerem outras opções.
Nesse trato, ele define a existência de dois tipos de sociedade: uma simples e outra complexa. Elias diz que as sociedades se tornam mais complexas e mais centralizadas quando a especialização aumenta e se diversificam as oportunidades oferecidas pela sociedade. As sociedades a medida que se tornam mais complexas vão abrindo maiores espaços para os indivíduos.
Essa parte do texto de Elias é bastante interessante. Nessa abordagem, ele toma a sociedade que evoluiu de simples para complexa e analisa o indivíduo como um ser adulto, que adentrou numa nova realidade de vida em sociedade e que passa a pertencer à outra configuração básica de vivência com grupos sociais. Segundo o autor, nas comunidades mais primitivas e unidas há a presença constante do outro fazendo o controle social, enquanto qua nas sociedades complexas, industrializadas, urbanizadas e densamente habitadas os adultos têm muito mais oportunidades, porém são acometidos de grande solidão. Mas, como é possível correr riscos, eles se orgulham das suas escolhas, da sua independência. Essas pessoas sofrem mudanças mentais significativas.
Elias considera a sociedade complexa como algo que é muito promissor aos indivíduos e ao mesmo tempo é angustiante. Segundo ele, o elevado nível de individualização ou independência pessoal, e não a solidão, característico desse tipo de sociedade, muitas vezes não se harmoniza com a complexa rede de dependência em que a pessoa se vê encerrada, decorrente de necessidades socialmente inculcadas. Segundo ele, essa trama de independência e dependência, de necessidade e capacidade de decidir sozinho, por um lado, e de impossibilidade de decidir sozinho, por outro, de responsabilidade por si e obediência ao Estado pode produzir tensões consideráveis.
Ao que nos parece, no que Elias aborda, os indivíduos sofrem um impasse: sentem a necessidade de se destacar e ao mesmo tempo de fazer parte. Segundo ele, o sentimento de participar, de estar envolvido, muitas vezes se mistura com o de estar descomprometido, desligado.
Ninguém sabe ao certo como conduzir-se diante de tal realidade. Por esse motivo, Elias acha necessário investigar esses problemas à luz das ciências humanas.
4. COMO SE INSCREVEM NO CONTEXTO DA SOCIEDADE AS PESSOAS PORTADORAS DO HIV/AIDS
Trazer à discussão dentro deste ensaio, o tema de nossa pesquisa é bastante significativo para nós, especialmente porque iremos tratar com questões acerca da relação entre indivíduo e sociedade. No caso específico, com pessoas portadoras de HIV-AIDS. A AIDS se configura, na contemporaneidade, como um grande flagrante na sociedade. Seu advento traz embutidas questões de teor diverso, denunciadoras do modus vivendis das populações, tais como: formas de organização social; construção, compreensão e representações da realidade social empírica; redimensionamento das práticas de vida, a partir das leituras e apropriações dos textos com os quais vão se deparando na sua cotidianidade e reordenamento das vivências, e, principalmente, um redimensionamento da relação entre o singular -o indivíduo- e o plural-a sociedade-, para usar termos de Elias (1994).
As particularidades das vivências das pessoas a que estamos nos referindo, materializam-se na cotidianidade de forma contundente e são cristalizadas pelos tipos de vida e pelos modos como elas se inscrevem nos campos sociais: grupos de pertença, lugares que conhecem e passeiam hábitos de vida diferenciados, e outros.
Neste sentido, a contribuição pretendida no estudo que realizaremos não está diretamente voltada para o estudo etiológico do vírus HIV, mas se funda e justifica na tentativa de definir, através da pesquisa científica, o perfil das pessoas portadoras e doentes de HIV-AIDS, a partir do modo como elas se redefinem individual e coletivamente nos vários campos sociais nos quais estão inseridas, após a sua nova condição de vida. E, ainda, na tentativa de precisar as formas como lidam com essa nova realidade e constroem, se o fazem, novas representações sociais e imaginárias, tanto sobre o próprio fenômeno HIV-AIDS, quanto sobre a sua vida pessoal, na sexualidade, no seu grupo familiar, no seu trabalho e na religião.
Dar um novo sentido a vida é a necessidade com a qual todos se deparam. Sentimentos de ordens diversas emergem, os laços sociais são estremecidos, os laços afetivos se quebram, ou se fortalecem. A crise de solidão é intensa, e como conseqüência nasce à insegurança quanto ao futuro. É justamente a partir desse estágio que nasce a necessidade de uma redefinição das instâncias identitárias: no plano individual e no plano da coletividade, novas representações sociais e imaginárias nascerão desse momento.
Conclusão
A discussão sobre as proposições de Elias apresentadas neste trabalho, apesar de bastante sintéticas, revela o quanto elucidativa pode se constituir para a pesquisa que pretendemos desenvolver, como indica a breve discussão elaborada no item 4.
Estas proposições dizem respeito, principalmente, a discussão sobre as tensões produzidas na trama entre a independência e dependência, a necessidade e capacidade de decidir sozinho, por um lado, e de impossibilidade de decidir, por outro, que tão bem materializam os conflitos entre o indivíduo e o seu contexto social, e que se apresentam de maneira radical entre as pessoas portadoras de HIV-AIDS, aspectos importantes que se constituíram em objeto de aprofundamento de análises posteriores.
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BIBLIOGRAFIA
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De Vida. São Paulo, Letras e Letras, 1994.
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10. WEBER, M. A Ética Protestante e o Espírito do Capitalismo. São Paulo, Biblioteca Pioneira de Ciências Sociais, 1987.
Projeto de Pesquisa para Qualificação no Mestrado
UNIVERSIDADE FEDERAL DE PERNAMBUCO
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM SOCIOLOGIA
CURSO DE MESTRADO EM SOCIOLOGIA
DISCIPLINA: MTPS I
PROFa TERCINA VERGOLINO
PROJETO DE PESQUISA
REPRESENTAÇÃO SOCIAL E AIDS:
A redefinição da identidade coletiva das pessoas portadoras de HIV-AIDS
Miriam Fialho da Silva
Recife, dezembro de 1996
ÍNDICE
PÁG.
Introdução ............................................................................. 03
O Problema ............................................................................... 09
Hipóteses e Variáveis................................................................ 16
Referencial Teórico................................................................... 17
Procedimentos Metodológicos................................................... 22
Referências Bibliográficas........................................................ 24
INTRODUÇÃO
A AIDS na contemporaneidade se configura em um grande flagrante na sociedade. Seu advento traz embutidas questões de teor diverso, denunciadoras do modus vivendis das populações, tais como: formas de organização social; construção, compreensão e representações da realidade social empírica; redimensionamento das práticas de vida, a partir das leituras e apropriações dos textos com os quais vão se deparando na sua cotidianidade e reordenamento das vivências.
Surgindo numa realidade histórica em que as grandes epidemias são dadas como erradicadas, pelo menos nos países desenvolvidos, a AIDS pôs em estado de inteira perplexidade toda a sociedade global, desdobrada nos seus diversos segmentos. A exemplo disso, poderemos citar algumas instituições sociais como o Estado, a ciência-médica, a família, a religião, o trabalho, e outras.
No trato dessa temática da AIDS se faz necessário, portanto, apreender as particularidades inerentes ao fenômeno que o tornam diferente de outros já ocorridos, como por exemplo, as grandes epidemias que assolaram o mundo: Peste Negra, Gripe Espanhola, Tuberculose, etc. Essas particularidades, que são bastante significativas, estão relacionadas às práticas de vida dos indivíduos no campo social e pessoal, identificadas como anormais, em alguns casos, por estarem dissociadas dos padrões éticos da moral social convencional não reconhecido como componentes do padrão “normal” de vida social. Muitas delas eram vivenciadas numa atitude que se pode cognominar de clandestinidade, e que só começaram a fluir a partir da AIDS.
As particularidades das vivências das pessoas a que estamos nos referindo, materializam-se na cotidianidade de forma contundente e são cristalizadas pelos tipos de vida e pelos modos como elas se inscrevem nos campos sociais: grupos de pertença, lugares que freqüentam hábitos de vida diferenciados, e outros, aspectos que no momento não aprofundaremos, pois, são questões que serão mais bem identificadas e desenvolvidas posteriormente. Numa primeira instância, nossa pretensão é unicamente situá-las no cenário da temática em discussão: a redefinição da identidade coletiva das pessoas vivendo com HIV-AIDS.
As pessoas afetadas pela epidemia da AIDS são muitas, e a estatística é incansável em revelar percentuais sempre em ordem cada vez mais ascendentes. São populações infanto-juvenis, jovens e adultos que hoje compõem o universo dos portadores e doentes de AIDS. O quadro atual é alarmante e denunciador. De um lado, verifica-se a fragilidade dos nossos serviços sociais de saúde, a falta de gerência da esfera pública no que concerne a oferta de políticas sociais para atendimento das necessidades básicas, e, de outro, a alienação das pessoas quanto a consciência de seus direitos enquanto cidadãs.
Dentre tantas situações calamitosas já vividas pela humanidade, no que percebemos através de relatos, leituras e quadros empíricos, nenhuma se aproxima da gravidade da epidemia da AIDS, tornando-se necessária uma leitura e um trato sério, livre dos preconceitos e dos estigmas da moral social.
A situação da epidemia no Brasil e no mundo é muito séria e, por isso, exige a participação de um grupo cada vez maior de pessoas, oriundas de todos os campos da sociedade, a fim de que a contribuição social seja dada em todas as instâncias- teóricas e empíricas-. Faz-se urgente, pois, um somatório de esforços para atingir a grande expectativa de todos: a cura, o descobrimento de uma vacina que instaure nos portadores e nos doentes a alegria e a esperança pela vida, por um lado, e, por outro, um amplo investimento num processo de prevenção efetiva e eficaz, que contribua para o retorno do pensar o futuro livre dos assombros da morte. Para tanto, é tempo, agora, de nos perguntarmos o que é possível fazer, como fazer, com quem e através de quem fazer.
O motivo que nos impulsiona a pesquisar este assunto é resultante, portanto, de um processo gradual de conscientização da problemática exposta até aqui. Esta idéia não nos ocorreu por acaso, mas resulta de um longo processo de contato com a questão feito através de leituras, discussões, palestras, filmes, etc., Na qualidade de estudiosa das questões sociais fui me aventurando a adentrar nesse tema, intentando de algum modo contribuir da forma mais concreta possível com essa questão. O tema nasce, exatamente, das minhas falas com pessoas envolvidas com a causa da AIDS, ligadas a entidades que trabalham pela questão, com pessoas que possuem portadores em sua família, com algumas pessoas portadoras, e com pesquisadores do assunto. Todo esse arsenal de informações permitiu o acesso à questão e se configurou num aporte essencial para elaboração desta proposta de trabalho.
A contribuição pretendida dentro dessa questão não está diretamente voltada para o estudo etiológico do vírus HIV, no sentido de abordar o seu surgimento e toda a trajetória percorrida pela ciência médica até chegar ao seu reconhecimento científico via OMS (Organização Mundial de Saúde), visto que esses aspectos já foram bastante contemplados em outros estudos produzidos até o presente. É certo que consideramos a pertinência de contemplar alguns tópicos nessa perspectiva, mas, unicamente, para dar um foco maior sobre o significado diferenciador entre essa e outras epidemias, permitindo que as pessoas que não tratam com esse assunto norteiem melhor suas reflexões. Porém, o que nos interessa pesquisar, e que consideramos ser inovador dentro dessa questão da AIDS, se funda e justifica na tentativa de definir, através da pesquisa científica, o perfil das pessoas portadoras e doentes de HIV-AIDS, a partir do modo como elas se redefinem individual e coletivamente nos vários campos sociais nos quais estão inseridas, após a sua nova condição de vida. E, ainda, na tentativa de precisar as formas como lidam com essa nova realidade e constroem, se o fazem, novas representações sociais e imaginárias, tanto sobre o próprio fenômeno HIV-AIDS, quanto sobre a sua vida pessoal, na sexualidade, no seu grupo familiar, no seu trabalho e na religião.
Em nossa análise partiremos do princípio de que a AIDS é um fato social universal, o que lhe confere o passaporte para ser tratada globalmente, ancorada na análise epistêmica das ciências sociais e, mais especificamente, da sociologia. Desse modo, pretendemos aprofundar a análise sociológica da AIDS, procurando contribuir para a construção do conhecimento científico acerca dos diversos modos e formas como a população portadora e doente de AIDS se porta ao se defrontar com a sua nova condição de vida e procuram dar outros nortes para a mesma, a partir dessa nova realidade.
O que justifica este estudo, ainda, é que não pretendemos produzir mais um trabalho sobre AIDS, como algo inovador construído em função da pungência do novo que a epidemia desperta. Mas sim, tratar de um tema que, queiramos ou não, é um assunto de todos. Portanto, toda a população do globo deverá estar envolvida com o trato da AIDS. Por isso, é urgente que a sociologia trate deste fenômeno, e sem o receio de estar entrando na seara alheia, de estar se intrometendo nas vidas afetadas pela epidemia. Poderemos advogar, também, que, até pela sua razão de ciência que estuda comportamentos sociais dos indivíduos, ela deverá tratar dessa questão. Além do fato de que se as pessoas adquirem o vírus da AIDS por meio de relações entre si, isto coloca para a sociologia o aporte necessário e urgente para investigação do assunto.
Outro aspecto importante a ser destacado é que a AIDS apresenta um caráter, essencialmente, interdisciplinar. As ciências, a exemplo da antropologia, psicologia, psicanálise, biologia, e outras, já ultrapassaram as fronteiras tradicionais que as separam e encamparam a luta pela saúde, buscando cada uma delas contribuir com a sua explicação paradigmática. É, justamente, dentro desse contexto que a sociologia pode se inscrever para, à luz do seu paradigma epistêmico, explicar como a AIDS, ao se introduzir na vida das pessoas, desvelou todo um conjunto de fatores intrínsecos as suas vidas, desarticulando-as da sua cotidianidade e forçando-as a confrontos inimagináveis e a novas posturas face a vida.
Esses fatores se configuram na exclusão social das pessoas portadoras, nos conflitos existenciais pelos quais elas passam na falta de políticas sociais que lhes dêem seguridade no seu tratamento, nas incertezas quanto à aceitação, ou não, por parte de suas famílias, no medo de perder seu trabalho, na insegurança do tempo de vida que lhes resta, na sua vida afetiva, sexual e religiosa.
Entendemos que o tratamento a ser dado pela sociologia para estas questões é fundamental, podendo se constituir numa contribuição importante, a partir da utilização de seu aporte teórico, para a análise de um problema empírico de grande significação social.
O nosso interesse em pesquisar sobre a AIDS se inscreve, também, na percepção de que, com o seu surgimento, uma nova perspectiva de mudanças nas relações sociais possa ser discutida, em função de práticas diferenciadas que se impõem na interação sociais entre as pessoas, gestadas em princípios mais sólidos, livres de preconceitos, mais abertos ao diálogo e menos castradores. Além disso, acreditamos que, a partir dessas mudanças, talvez a AIDS possa se libertar de todo o estigma criado a seu respeito, e seja tratada como o que ela realmente é: uma epidemia, como outras, que tem afetado muitas pessoas, como o câncer, por exemplo.
Neste sentido, nossos objetivos com a realização deste estudo podem ser materializados em duas intenções: a primeira, que identificamos como o objetivo geral, é analisar os modos como as pessoas portadoras de HIV-AIDS redefinem as suas instâncias identitárias na coletividade e produzem, assim, novas representações sociais e imaginárias. A segunda, que se constituem em nossos objetivos específicos, é: a) avaliar as representações sociais dominantes entre os diferentes tipos de pessoas portadoras: infectados por contato sexual, infectados por uso de drogas e infectados por outros modos; b) analisar como a questão do gênero influi nas prioridades dos portadores; c) identificar a origem social das pessoas portadoras e analisar se ela influi no processo de redefinição a partir do tratamento médico que lhes é dado.
Nessa perspectiva acima referida, consideramos a nossa proposta de pesquisa exeqüível, visto que o nosso objeto empírico está materializado nas pessoas portadoras vivendo com HIV-AIDS e em todo o referencial de publicações existente, o que nos permitirá o acesso para execução das etapas necessárias ao seu desenvolvimento.
Consideramos, ainda, que a pesquisa, a partir do enfoque que pretendemos desenvolver, poderá vir a dar uma importante contribuição no âmbito da análise sociológica, frente ao novo momento de reflexões acerca de seus modelos teóricos.
O PROBLEMA
A AIDS nos proporciona um momento histórico de profundas reflexões. Surgindo numa realidade social hedônica, em que o homem moderno aumentou a sua longevidade, pondo a idéia da morte cada vez mais distante de si, a AIDS aparece se inscrevendo no cenário social como um fato real e concernente a todos.
Segundo Camargo (1994), a AIDS é a epidemia que, no final do século XX, tem representações semelhantes à tuberculose, ao câncer, e traz acrescida as categorias de ser sexualmente transmissível, da ação lenta do agente etiológico e da existência de um portador sadio.
Segundo a autora acima citada, quando as grandes epidemias, a exemplo da febre amarela, da varíola, foram controladas ou foram fracamente endêmicas, sempre surgiram outras, como a gripe espanhola que afetou continentes inteiros -1918 a 1919-, trazendo grande mortalidade para todo o globo. A tuberculose foi uma dessas epidemias de caráter infeccioso. Considerada a doença do século XIX e do início do século XX, só foi identificada após dizimar muitas vidas e após longo trabalho de investigação. Pela crueldade de seus danos ela foi tida como uma peste da urbanização, da industrialização e das precárias condições de vida do proletariado.
Nas últimas décadas do século XX, surge a AIDS como a exterminadora do presente. Traz consigo o pânico da morte, o confronto com os limites humanos, com a redefinição do tempo da vida, ao mesmo tempo em que possibilita uma visão mais abrangente da mesma.
A epidemia da AIDS é formada por um conjunto de fatores que a definem e explicam de modo bastante complexo, o que, até hoje, ainda não é compreendido por um grande contingente da população. Isto pode ser justificado pelo modo como foi difícil para a própria ciência médica diagnosticar a etiologia da virose que se pressupunha, à época das primeiras investigações, serem a causadora daqueles óbitos.
Até o presente, ainda, encontramos pessoas que não crêem na existência da AIDS, atribuindo tudo a “coisas para amedrontar as pessoas”, ou como fazendo parte de um “jogo político” dos laboratórios. É um mito, uma história, ou coisa dos estrangeiros, porém, nada tem a ver conosco, etc.
As primeiras notícias sobre a AIDS chegam dos Estados Unidos em 1981, através de um órgão governamental americano: Center for Disease Control. Cidades como a Califórnia e Nova Yorque atestavam mortes de jovens e adultos masculinos que tinham em comum a homossexualidade e que ocorriam de forma inusitada, combinando raros tipos de cânceres com pneumonias comuns. Esses casos foram descritos como estados de imunodeficiência. Ou seja, uma diminuição dos recursos orgânicos tradicionalmente requisitados para manter o corpo “imune” às infecções (CAMARGO JR., 1994).
A epidemia da AIDS é, portanto, uma doença nova, tendo sido diagnosticada no princípio dos anos 80, pelos franceses e americanos. O termo “AIDS” é uma sigla originada do nome inglês: “Acquired Imune Deficiency Síndrome”, que se traduz por: “Síndrome da Imunodeficiência Adquirida” (em português também se pode chamar SIDA). O termo síndrome significa um conjunto de doenças que se manifesta em várias formas de mal-estar que aparecem juntas. No caso da AIDS, esse conjunto de doenças e sintomas pode ir de diarréias e vômitos, a gânglios inchados, sarcoma de kaposi (que é um tipo de câncer visível em doenças epidérmicas que são manchas vermelhas-), e outras patologias como, doenças respiratórias, tuberculose, herpes, toxoplasmose, perda de peso acentuada e outros. Isto é, são sintomas e doenças conhecidas que, isoladamente, não seriam tão problemáticas, nem letais, como no contexto da AIDS.
O termo Imunodeficiência configura-se na falha das defesas do organismo. Uma doença que seria simples e até inofensiva numa pessoa saudável, no caso da AIDS assume um caráter complexo e de riscos significativos.
O conjunto celular do corpo é definido pelos cientistas como o “sistema imunitário”. Esse sistema é uma massa de tecidos e células espalhadas por todo o corpo. A organização desse conjunto de células funciona de modo a proteger o corpo de infecções. A AIDS é, pois, a doença do sistema imunitário, assim como a hepatite é a doença do fígado, a gastrite é a doença do estômago, etc. Portanto, com o sistema imunitário comprometido -em imunodeficiência- as infecções podem se tornar muitos graves, mais do que realmente são. Essas infecções que se aproveitam das falhas do sistema imunitário são chamadas de infecções oportunistas (ABIA, 1994).
A palavra “adquirida” diz respeito ao aparecimento dos primeiros casos de AIDS. Segundo os patologistas, as doenças do sistema imunitário são raras. Algumas pessoas nascem com elas, outras as têm por razões desconhecidas, ou ainda, porque fizeram transplante, etc. Todavia, uma doença imunitária em caráter de epidemia, atingindo comunidades inteiras se configura em algo inédito. A imunodeficiência é, em algum momento, “adquirida” pela pessoa.
Desse modo, a AIDS é uma doença imunológica, resultante de uma infecção por um vírus que é transmissível em circunstâncias determinadas de troca íntima de fluidos do corpo. Esta troca pode ocorrer através do ato sexual, da transfusão de sangue, da gestação, do nascimento e da amamentação (idem).
O sistema imune é o alvo do assalto do HIV. O vírus é um parasita que invade e se apropria, de preferência, da máquina genética de uma célula crítica do sistema de defesa humano: a chamada T auxiliadora, que tem como função incentivar as células que fazem os anticorpos e as que ajudam a controlar as infecções por fungos e bactérias. Para poder entrar na T auxiliar, o vírus HIV utiliza proteínas que ficam na superfície dessa célula, em particular a chamada CD4.
O HIV é um retrovírus, o que significa que a sua forma de vida é a mais simples, arcaica e bruta, e é disso que a sua força deriva (Revista VEJA nov., 1996). HIV significa Human Imunedeficiency Virus (Vírus da Imunodeficiência Humana). Trata-se de um vírus que possui características muito particulares e por isso pode passar, e em muitas situações, passa despercebido por muito tempo no corpo dos seres humanos, sem se manifestar. Infecta de modo lento, não apresentando sintomas de contágio.
Portanto, dentro dessa discussão da Síndrome da Imunodeficiência Adquirida se distinguem dois estágios: um de soropositividade e, outro, de doença da AIDS. Esses são estágios diferenciados em que alguém pode ser um soro positivo assintomático por muito tempo, ou então, alguém já está com a manifestação dos sintomas da doença, é o que se considera como o estado avançado da infecção por HIV-AIDS. Essa é uma fase bem mais delicada na vida das pessoas, visto que elas se confrontam com a sua própria existência, a sua vida íntima e seus referenciais sociais na coletividade.
Diante do que está posto acerca dessa epidemia, fica notório que a AIDS se diferencia de outras já ocorridas no mundo por sua patogêneses: a AIDS é uma doença do sistema imunológico. Ela é adquirida pelo vírus HIV que ataca esse sistema celular e o enfraquece, levando as pessoas a morte. Esta é a constatação a qual tiveram, e ainda terão que chegar às populações do mundo.
Por esta constituição viral se entende, portanto, que a AIDS não é um castigo, não é um mistério, não é uma arma planejada e nem resulta de nenhum desequilíbrio. Não é nada mais do que uma epidemia, que a exemplo de tantas outras causou preocupações e pânico às populações e, também, como essas tantas outras que não foram ainda erradicadas, ficará sob a guarda da ciência médica, até que um dia o seja.
Neste ponto, uma questão bastante significativa precisa ser colocada, pois, mesmo sendo mais uma epidemia, a AIDS se diferencia muito das outras, o que leva ao questionamento sobre o que é que a torna tão diferente? O que há de subjacente a essa condição de epidemia que a torna tão apavorante? Por que as pessoas têm tanto pavor da AIDS?
De princípio, podemos afirmar que a AIDS se configura num fenômeno marcado por estigmas, o que pode ser facilmente verificado fazendo-se um resgate do período de seu surgimento. Caminho que pode apontar as respostas para essas e muitas outras questões.
Alguns estudiosos do assunto, pelo menos aqui no Brasil, tais como médicos assistentes sociais, psicólogos, psiquiatras, antropólogos, sociólogos, e demais, são unânimes em constatar que algumas das razões que explicam o estigma dessa epidemia estão calcadas em alguns conceitos nos quais se fundaram a AIDS. Dizem respeito ao modo como ela foi notificada, através da mídia, para o globo: “uma peste dos culpados” (PARKER, 1994). A AIDS era uma doença de “grupos de risco”. Esses grupos se dividiam em “vítimas” (hemofílicos) e “promíscuos” (homossexuais, prostitutas, viciados em drogas). Durante mais de dez anos, as idéias sobre esse fenômeno foram as mais distorcidas possíveis. Falava-se muito mais na pessoa que estava doente, do que na própria doença. Essas pessoas chamavam mais a atenção do que a doença (PAIVA, 1992).
A AIDS se inscreve num período da vida social em que a intimidade passa por grandes transformações. A sua caracterização inicial de doença infecto-contagiosa, incurável, mortal, vinculada em primeira instância a homossexualidade, fez o seu aporte em muitos estigmas: pessoas que se decidiram por viver a vida e a sua sexualidade de modo alternativo, seriam castigadas com a morte por AIDS.
O peso social da AIDS é muito grande. Ela se configura num fenômeno que se materializou na carne dos atores sociais, e é esse um dos fatores que a diferencia das outras epidemias. Segundo Rouet (1996:16-20), “a SIDA, mais do que qualquer outra doença, tornou-se um fenômeno social muito importante; ela transtorna a escola, a empresa, a justiça, a igreja”. Fazendo um aporte na escrita do autor, acrescentamos que ela, também, flagrou o próprio portador na sua instância identitária, nos seus grupos de pertença, tais como, a família, a religião e o trabalho. “Estar doente é ter passado por diversas etapas, é ser levado a passar por outras. Em primeiro lugar houve o anúncio da contaminação com o prognóstico, inevitável no atual estado de conhecimentos, de morte num prazo mais ou menos longo. Depois vem a fase de soropositividade sem sintomas, sem sinais físicos de doença, quando a pessoa acometida vive na expectativa ou na angústia, reorganiza seu modo de vida, durante alguns meses ou anos” (idem, ibdem).
A condição de que a pessoa é portadora de HIV-AIDS parece ser a condição sine qua non para que busquem outros modos de viver suas vidas, redefinindo novas relações com o tempo, reconstruindo novas relações afetivas, novas representações sociais e imaginárias na sua cotidianidade, novas posturas em face de sua condição de gênero, a sua vida pessoal e profissional, a seu status social, e as suas questões ontológicas e existenciais quanto a sua própria prática religiosa.
Frente ao exposto, levantamos algumas questões que consideramos pertinentes à essa temática e fundamentais como ponto de partida à investigação pretendida, e que deverão ser respondidas no decorrer da mesma. Tais questões, pois, constituir-se-ão em nosso problema de pesquisa.
Na perspectiva da problemática da AIDS exposta até aqui, que aponta para uma nova condição de vida em que as pessoas são postas a partir de um diagnóstico médico da sua infecção, poderíamos perguntar se esta nova condição determina a necessidade de uma redefinição de sua identidade coletiva e a construção de novas representações sociais e imaginárias, e se, em função desse processo, são produzidas novas experiências cotidianas na sexualidade, na família, no trabalho e na religião? Poderíamos perguntar, ainda, se o gênero, especialmente no que se refere a redefinição de prioridades, e a condição social das pessoas portadoras, evidenciada através do tratamento médico recebido, podem se constituir em elementos intervenientes desse processo de redefinição?
Para tentar responder a estas questões, partimos do pressuposto de que a nova condição de pessoa portadora desencadeia um processo de redefinição da identidade individual e coletiva, processo que se gesta em função da grande exclusão social a que são submetidas essas pessoas por parte dos seus grupos de pertença.
HIPÓTESES E VARIÁVEIS
A partir deste pressuposto, afirmamos como hipótese central de nossa investigação que os tipos de experiências das pessoas portadoras de HIV-AIDS levam-nas a produzirem redefinições da sua identidade coletiva e a construção de novas representações sociais e imaginárias na sua cotidianidade, envolvendo sua sexualidade, sua vida na família, na religião e no trabalho.
Consideramos que esse processo de redefinição se dá de forma diferenciada, a partir da intervenção de certas condições particulares a determinados grupos sociais. Na tentativa de contemplar esses aspectos em nossa investigação, tomaremos, em especial, duas dessas condições que entendemos como mais significativas para nossa análise e que denominaremos de variáveis intervenientes, a saber: a redefinição de prioridades em função do gênero e da condição social. Essas variáveis indicam, portanto, condições que podem intervir de forma mais significativa no processo de redefinição da identidade coletiva da pessoa portadora e se configuram, mais especificamente, através das seguintes hipóteses auxiliares:
1. A condição de gênero influi na redefinição das prioridades das pessoas portadoras de HIV-AIDS;
2. A qualidade do tratamento médico prestado as pessoas portadoras do HIV-AIDS depende de sua condição social e materializa o seu status, influenciando na redefinição de suas instâncias identitárias.
REFERENCIAL TEÓRICO
A ciência se caracteriza, por um lado, pela produção do conhecimento e, por outro, pela produção de mecanismos que buscam a validação dessa produção. Fazer ciência social, portanto, significa produzir conhecimentos válidos, úteis à explicação dos fenômenos sociais, nas diversas instâncias disciplinares de investigação.
Nesta direção, para se dar conta de uma produção científica, faz-se essencial a utilização de um conjunto de instrumentos teórico-metodológicos que referendem as práticas das diversas fases da pesquisa. Teóricos como Chalmers (1993), Kuhn (1989), são rigorosos na discussão que aponta para a necessidade de observação desses critérios, tomando-os como condição sine qua non à construção do conhecimento científico.
Na pesquisa pretendida, nosso intento será o de tomar essa discussão como questão substancial, dando um tratamento rigoroso para as análises conceituais do objeto empírico, construindo categorias no marco universal da ciência de maneira que as mesmas venham a dar conta da comprovação das hipóteses propostas, objetivo principal de todo trabalho científico.
Em nosso estudo, no que se refere à hipótese principal, na qual procuramos estabelecer uma relação de determinação entre a condição de pessoa portadora de HIV-AIDS e a redefinição da sua identidade coletiva e, necessariamente, a construção de novas representações sociais e imaginárias, será fundamental definir as categorias conceituais formadoras do nosso conjunto de variáveis, a saber: a) identidade coletiva; b) representação social; e c) imaginário social. A definição dessas categorias deverá se constituir numa atividade importante a ser realizada durante o desenvolvimento do projeto, indicando o marco principal para a operacionalização dos conceitos que iremos trabalhar. Na operacionalização dos conceitos, pretendemos, portanto, fazer um mapeamento das perspectivas teóricas de alguns autores que discutem estes conceitos, a exemplo de Serge Moscovici, Cornelius Castoriadis, e outros.
Ainda no que se refere as hipóteses, precisamos considerar as hipóteses auxiliares identificadas no item anterior. Estas foram construídas a partir da relação que conseguimos estabelecer entre as variáveis da hipótese principal e outras variáveis, que denominaremos de variáveis intervenientes.
Para uma melhor visualização da relação entre as variáveis, apresentamos o esquema a seguir:
VARIÁVEL INDEPENDENTE (A) VARIÁVEL INDEPENDENTE (B)
-condição de portador de HIV-AIDs -redefinição da identidade coletiva e
construção de novas representações sociais
e imaginárias
VARIÁVEL INTERVENIENTE ©
-definição de prioridades em função de gênero e condição social
A relação entre as três variáveis contempla os seguintes aspectos:
l. A variável A é determinante da variável B
2. A variável A é determinante da variável c
3. A variável c é determinante de B.
Denominamos a variável c de variável interveniente por se constituir numa conseqüência da variável independente e determinante da variável dependente.
No caso das hipóteses que estão sendo propostas, podemos afirmar que a VARIÁVEL INTERVENIENTE se coloca entre as variáveis INDEPENDENTES (A) e DEPENDENTE (B), com a função de esclarecer a influência de A sobre B.
Podemos afirmar, portanto, que a variável A -condição de portador- é determinante de B - redefinição da identidade. Que a variável A -condição de portador - é determinante de c. Ou seja, a redefinição das prioridades da vida das pessoas em função do gênero e da condição social, se encontra numa relação de dependência da constatação de sua condição de portador. E que, a variável B é determinada pela variável A e c.
Neste ponto, cabe uma discussão acerca de cada um dos aspectos envolvidos nas hipóteses que estamos propondo, bem como das variáveis que estamos apresentando em função da operacionalização das hipóteses. Afirmamos, de princípio, que os tipos de experiências das pessoas portadores de HIV-AIDS levam-nas a produzirem redefinições das suas representações sociais e imaginárias na sua cotidianidade, no campo pessoal, na família, na religião e no trabalho. Esses tipos de experiências materializam a existência de dois momentos bem distintos da vida dessas pessoas. Um, antes do diagnóstico médico, que se define pelo modo como elas vivem a sua vida, pelas escolhas que fizeram até o presente momento, etc., e outro que passará a ser produzido após o diagnóstico médico da sua soropositividade ou doença de AIDS. A partir dessa nova condição que lhes é imposta por esse novo quadro, elas se percebem numa situação bastante delicada e entram num grande conflito existencial.
Geralmente vão buscar as experiências vividas no passado, procurando descobrir em que tempo de suas vivências se deu o seu contágio, ou de que modo elas podem ter sido infectadas. Todos os tipos de experiências são revistas, assim como as escolhas feitas, as relações sociais produzidas, e o confronto com “o que fazer agora”? De acordo com alguns depoimentos citados em autores, tais como: Camargo (1994); Paiva (1992); Rouet (1996), bem como em documentários, artigos em jornais e revistas, esse fato é passivo de ser constatado sem grandes dificuldades.
Dar um novo sentido a vida é a necessidade com a qual todos se deparam. Sentimentos de ordens diversas emergem, os laços sociais são estremecidos, os laços afetivos se quebram, ou se fortalecem. A crise de solidão é intensa, e como conseqüência nasce a insegurança quanto ao futuro. É justamente a partir desse estágio que nasce a necessidade de uma redefinição das instâncias identitárias: no plano individual e no plano da coletividade, novas representações sociais e imaginárias nascerão desse momento.
Nas outras duas hipóteses que nós levantamos as quais consideramos como hipóteses auxiliares, afirmamos a existência de dois aspectos que, a nosso ver, influi na redefinição das prioridades dessas pessoas, influenciando no seu processo de redefinição de identidade coletiva e na construção de novas representações sociais e imaginárias. Esses aspectos são o gênero e a condição social de cada uma delas,
No trato da questão do gênero, consideramos que esta condição influi na redefinição de algumas prioridades que passam a ser relevantes, tais como: o papel do outro na vida da pessoa portadora, a redefinição do que deve ser priorizado após essa nova condição na vida afetiva; os rumos que se darão às práticas sexuais; e também o fato da AIDS forçar um novo olhar dos sexos sobre a vida. As questões da sexualidade são postas com grande ênfase, apontando para a necessidade de uma discussão sobre a intimidade. Neste sentido, os vínculos da afetividade, a qualidade e o modo de vida íntima dos parceiros, são postos em cheque.
No que se refere a qualidade do tratamento médico dado à essas pessoas portadoras, momento significativo na percepção da condição social de suas vidas, podemos verificar que ele não é feito do mesmo modo para todos. Os serviços públicos de saúde oferecidos para todos, em muitos casos, tornam-se ineficientes para atender uma pessoa portadora de condição social elevada, levando-a a procurar a rede privada, o que materializa um tratamento diferenciado entre as pessoas portadoras e, conseqüentemente, interferirá na forma como essas pessoas vão lidar com uma série de questões em sua vida. Esse é apenas um dos aspectos abordados aqui.
Tem-se que discutir, também, o papel do médico na relação com o paciente, especialmente no que se refere ao tratamento que é dado aos mesmos em face de condição social que cada um apresenta. Nesse sentido, entram as questões do atendimento hospitalar, do acesso ao tratamento médico, da aquisição dos medicamentos e dos preconceitos dos médicos em face de essas pessoas, no campo econômico e na sexualidade.
Outros aspectos que pretendemos tratar dentro dessa temática se expressam nas relações sociais das pessoas portadoras quanto ao seu grupo familiar, a sua religião, se pratica alguma, aos seus trabalhos e a sua vida pessoal no aspecto da sexualidade.
Em conclusão, “a produção do conhecimento científico pode analogicamente ser vista como tantos outros ciclos produtivos” (Camargo Jr. 1994:25). Tomar um tema específico dentro da problemática da AIDS e categorizá-lo cientificamente significa dar a esse fenômeno um caráter de seriedade e validade rigoroso no campo da ciência.
Portanto, reconhecer na AIDS construções metodológicas categorizáveis a partir do enfoque teórico-sociológico, visto que essa forma de enfoque não nega a sua característica terapêutica de doença muito grave que se manifesta nas manifestações patológicas dos seres humanos, como poderiam pensar algumas pessoas, e sim, abre as expectativas para a discussão desse tema, no âmbito de uma nova abordagem da ciência, fato que poderá se constituir numa contribuição importante para o vislumbramento das soluções concretas para o problema.
METODOLOGIA
Diante da abordagem temática em questão, pretendemos conduzir a investigação em dois momentos.
No primeiro momento, tomaremos como referência da análise:
a) os documentos em que são definidos os programas para divulgação, tratamento e acompanhamento, etc.., da questão AIDS;
b) as propagandas veiculadas pelos órgãos oficiais, e outros correlatos, na imprensa televisiva, tomando como proposição básica a conduta das pessoas portadoras face a essas propagandas;
c) os filmes (históricos e documentários) produzidos pela imprensa cinematográfica, procurando identificar nas representações dos atores situações similares a realidade concreta das pessoas portadoras. Temas e discussões que pressupomos se materializarão na investigação empírica. Esses dados serão relativos ao período 1990-1996.
No segundo momento, trabalharemos com a população de pessoas portadoras que esteja recebendo atendimento em um hospital de referência e em uma Organização Não Governamental (ONG), na Região Metropolitana do Recife. Atualmente são oito os locais entre hospitais e núcleos de acompanhamento na prevenção oficialmente existentes. Quanto as ONGs, que também prestam atendimento relevante tanto na prevenção como na intervenção, temos o FÓRUM-AIDS, a ASAS, a GESTOS, dentre outras.
Para tanto, pretendemos proceder da seguinte forma: tomar uma amostra representativa do universo amostral total, segundo os critérios formais da metodologia da pesquisa científica; a partir da definição da amostra, fazer a análise de dados, usando as técnicas da análise qualitativa, através de entrevistas com perguntas abertas e semi-estruturadas. Para a análise dos dados, faremos o aporte nos teóricos que tratam dessa técnica, a exemplo de Haguette (1987), Miles e Huberman (1994).
Os conteúdos das entrevistas serão definidos de acordo com a categorização da população amostral, que será realizada em função de dois grupos fundamentais: grupo 1.soropositivos assintomáticos, e grupo 2. Portadores da doença. Esta população será composta por pessoas jovens e adultas, de ambos os sexos.
As entrevistas terão um universo de conteúdo que buscará investigar as experiências de vida das pessoas portadoras antes e depois do diagnóstico médico, no intento de identificar suas instâncias identitárias nesses dois contextos de forma comparativa.
CONCLUSÃO
Este Projeto será desenvolvido como a ferramenta instruemntal para a coleta de dados no campo empírico, que serão duas ONGs, previamente escolhidas. Essas ONGs funcionarão como um conselho de ética na pesquisa, visto que os recursos metodológicos que serão usados, deverão estar em consonância com a realidade de vida da população alvo da pesquisa, que são pessoas portadoras de vírus HIV/Aids. Em princípio disponibilizaresmo o Projeto para que os sociólogs e coordenadores analisem todo o texto e os procedimentos metodológicos, como: questionário de entrevistas e outros procedimentos para tratar com o público que será entrevistado. O tempo da pesquisa será aproximadamente de dois meses, sendo que antes de começar a pesquisa faremos o pré-teste, a partir do qual estaremos corrigindo o texto do questionário. Esse pré-teste constará de entrevistar duas pessoas para apreender se o quetionária corresponde ao que se está querendo analisar.
Por fim, os dados coletados serão analisados, nos modes da análise qualitativa e também do material bibliográfico que será utilizado como a fonte literaria e teórica onde se encontrará as explicações que nos daram condições de saber se as nossas hipótese e variáveis estão certas ou erradas.
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PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM SOCIOLOGIA
CURSO DE MESTRADO EM SOCIOLOGIA
DISCIPLINA: MTPS I
PROFa TERCINA VERGOLINO
PROJETO DE PESQUISA
REPRESENTAÇÃO SOCIAL E AIDS:
A redefinição da identidade coletiva das pessoas portadoras de HIV-AIDS
Miriam Fialho da Silva
Recife, dezembro de 1996
ÍNDICE
PÁG.
Introdução ............................................................................. 03
O Problema ............................................................................... 09
Hipóteses e Variáveis................................................................ 16
Referencial Teórico................................................................... 17
Procedimentos Metodológicos................................................... 22
Referências Bibliográficas........................................................ 24
INTRODUÇÃO
A AIDS na contemporaneidade se configura em um grande flagrante na sociedade. Seu advento traz embutidas questões de teor diverso, denunciadoras do modus vivendis das populações, tais como: formas de organização social; construção, compreensão e representações da realidade social empírica; redimensionamento das práticas de vida, a partir das leituras e apropriações dos textos com os quais vão se deparando na sua cotidianidade e reordenamento das vivências.
Surgindo numa realidade histórica em que as grandes epidemias são dadas como erradicadas, pelo menos nos países desenvolvidos, a AIDS pôs em estado de inteira perplexidade toda a sociedade global, desdobrada nos seus diversos segmentos. A exemplo disso, poderemos citar algumas instituições sociais como o Estado, a ciência-médica, a família, a religião, o trabalho, e outras.
No trato dessa temática da AIDS se faz necessário, portanto, apreender as particularidades inerentes ao fenômeno que o tornam diferente de outros já ocorridos, como por exemplo, as grandes epidemias que assolaram o mundo: Peste Negra, Gripe Espanhola, Tuberculose, etc. Essas particularidades, que são bastante significativas, estão relacionadas às práticas de vida dos indivíduos no campo social e pessoal, identificadas como anormais, em alguns casos, por estarem dissociadas dos padrões éticos da moral social convencional não reconhecido como componentes do padrão “normal” de vida social. Muitas delas eram vivenciadas numa atitude que se pode cognominar de clandestinidade, e que só começaram a fluir a partir da AIDS.
As particularidades das vivências das pessoas a que estamos nos referindo, materializam-se na cotidianidade de forma contundente e são cristalizadas pelos tipos de vida e pelos modos como elas se inscrevem nos campos sociais: grupos de pertença, lugares que freqüentam hábitos de vida diferenciados, e outros, aspectos que no momento não aprofundaremos, pois, são questões que serão mais bem identificadas e desenvolvidas posteriormente. Numa primeira instância, nossa pretensão é unicamente situá-las no cenário da temática em discussão: a redefinição da identidade coletiva das pessoas vivendo com HIV-AIDS.
As pessoas afetadas pela epidemia da AIDS são muitas, e a estatística é incansável em revelar percentuais sempre em ordem cada vez mais ascendentes. São populações infanto-juvenis, jovens e adultos que hoje compõem o universo dos portadores e doentes de AIDS. O quadro atual é alarmante e denunciador. De um lado, verifica-se a fragilidade dos nossos serviços sociais de saúde, a falta de gerência da esfera pública no que concerne a oferta de políticas sociais para atendimento das necessidades básicas, e, de outro, a alienação das pessoas quanto a consciência de seus direitos enquanto cidadãs.
Dentre tantas situações calamitosas já vividas pela humanidade, no que percebemos através de relatos, leituras e quadros empíricos, nenhuma se aproxima da gravidade da epidemia da AIDS, tornando-se necessária uma leitura e um trato sério, livre dos preconceitos e dos estigmas da moral social.
A situação da epidemia no Brasil e no mundo é muito séria e, por isso, exige a participação de um grupo cada vez maior de pessoas, oriundas de todos os campos da sociedade, a fim de que a contribuição social seja dada em todas as instâncias- teóricas e empíricas-. Faz-se urgente, pois, um somatório de esforços para atingir a grande expectativa de todos: a cura, o descobrimento de uma vacina que instaure nos portadores e nos doentes a alegria e a esperança pela vida, por um lado, e, por outro, um amplo investimento num processo de prevenção efetiva e eficaz, que contribua para o retorno do pensar o futuro livre dos assombros da morte. Para tanto, é tempo, agora, de nos perguntarmos o que é possível fazer, como fazer, com quem e através de quem fazer.
O motivo que nos impulsiona a pesquisar este assunto é resultante, portanto, de um processo gradual de conscientização da problemática exposta até aqui. Esta idéia não nos ocorreu por acaso, mas resulta de um longo processo de contato com a questão feito através de leituras, discussões, palestras, filmes, etc., Na qualidade de estudiosa das questões sociais fui me aventurando a adentrar nesse tema, intentando de algum modo contribuir da forma mais concreta possível com essa questão. O tema nasce, exatamente, das minhas falas com pessoas envolvidas com a causa da AIDS, ligadas a entidades que trabalham pela questão, com pessoas que possuem portadores em sua família, com algumas pessoas portadoras, e com pesquisadores do assunto. Todo esse arsenal de informações permitiu o acesso à questão e se configurou num aporte essencial para elaboração desta proposta de trabalho.
A contribuição pretendida dentro dessa questão não está diretamente voltada para o estudo etiológico do vírus HIV, no sentido de abordar o seu surgimento e toda a trajetória percorrida pela ciência médica até chegar ao seu reconhecimento científico via OMS (Organização Mundial de Saúde), visto que esses aspectos já foram bastante contemplados em outros estudos produzidos até o presente. É certo que consideramos a pertinência de contemplar alguns tópicos nessa perspectiva, mas, unicamente, para dar um foco maior sobre o significado diferenciador entre essa e outras epidemias, permitindo que as pessoas que não tratam com esse assunto norteiem melhor suas reflexões. Porém, o que nos interessa pesquisar, e que consideramos ser inovador dentro dessa questão da AIDS, se funda e justifica na tentativa de definir, através da pesquisa científica, o perfil das pessoas portadoras e doentes de HIV-AIDS, a partir do modo como elas se redefinem individual e coletivamente nos vários campos sociais nos quais estão inseridas, após a sua nova condição de vida. E, ainda, na tentativa de precisar as formas como lidam com essa nova realidade e constroem, se o fazem, novas representações sociais e imaginárias, tanto sobre o próprio fenômeno HIV-AIDS, quanto sobre a sua vida pessoal, na sexualidade, no seu grupo familiar, no seu trabalho e na religião.
Em nossa análise partiremos do princípio de que a AIDS é um fato social universal, o que lhe confere o passaporte para ser tratada globalmente, ancorada na análise epistêmica das ciências sociais e, mais especificamente, da sociologia. Desse modo, pretendemos aprofundar a análise sociológica da AIDS, procurando contribuir para a construção do conhecimento científico acerca dos diversos modos e formas como a população portadora e doente de AIDS se porta ao se defrontar com a sua nova condição de vida e procuram dar outros nortes para a mesma, a partir dessa nova realidade.
O que justifica este estudo, ainda, é que não pretendemos produzir mais um trabalho sobre AIDS, como algo inovador construído em função da pungência do novo que a epidemia desperta. Mas sim, tratar de um tema que, queiramos ou não, é um assunto de todos. Portanto, toda a população do globo deverá estar envolvida com o trato da AIDS. Por isso, é urgente que a sociologia trate deste fenômeno, e sem o receio de estar entrando na seara alheia, de estar se intrometendo nas vidas afetadas pela epidemia. Poderemos advogar, também, que, até pela sua razão de ciência que estuda comportamentos sociais dos indivíduos, ela deverá tratar dessa questão. Além do fato de que se as pessoas adquirem o vírus da AIDS por meio de relações entre si, isto coloca para a sociologia o aporte necessário e urgente para investigação do assunto.
Outro aspecto importante a ser destacado é que a AIDS apresenta um caráter, essencialmente, interdisciplinar. As ciências, a exemplo da antropologia, psicologia, psicanálise, biologia, e outras, já ultrapassaram as fronteiras tradicionais que as separam e encamparam a luta pela saúde, buscando cada uma delas contribuir com a sua explicação paradigmática. É, justamente, dentro desse contexto que a sociologia pode se inscrever para, à luz do seu paradigma epistêmico, explicar como a AIDS, ao se introduzir na vida das pessoas, desvelou todo um conjunto de fatores intrínsecos as suas vidas, desarticulando-as da sua cotidianidade e forçando-as a confrontos inimagináveis e a novas posturas face a vida.
Esses fatores se configuram na exclusão social das pessoas portadoras, nos conflitos existenciais pelos quais elas passam na falta de políticas sociais que lhes dêem seguridade no seu tratamento, nas incertezas quanto à aceitação, ou não, por parte de suas famílias, no medo de perder seu trabalho, na insegurança do tempo de vida que lhes resta, na sua vida afetiva, sexual e religiosa.
Entendemos que o tratamento a ser dado pela sociologia para estas questões é fundamental, podendo se constituir numa contribuição importante, a partir da utilização de seu aporte teórico, para a análise de um problema empírico de grande significação social.
O nosso interesse em pesquisar sobre a AIDS se inscreve, também, na percepção de que, com o seu surgimento, uma nova perspectiva de mudanças nas relações sociais possa ser discutida, em função de práticas diferenciadas que se impõem na interação sociais entre as pessoas, gestadas em princípios mais sólidos, livres de preconceitos, mais abertos ao diálogo e menos castradores. Além disso, acreditamos que, a partir dessas mudanças, talvez a AIDS possa se libertar de todo o estigma criado a seu respeito, e seja tratada como o que ela realmente é: uma epidemia, como outras, que tem afetado muitas pessoas, como o câncer, por exemplo.
Neste sentido, nossos objetivos com a realização deste estudo podem ser materializados em duas intenções: a primeira, que identificamos como o objetivo geral, é analisar os modos como as pessoas portadoras de HIV-AIDS redefinem as suas instâncias identitárias na coletividade e produzem, assim, novas representações sociais e imaginárias. A segunda, que se constituem em nossos objetivos específicos, é: a) avaliar as representações sociais dominantes entre os diferentes tipos de pessoas portadoras: infectados por contato sexual, infectados por uso de drogas e infectados por outros modos; b) analisar como a questão do gênero influi nas prioridades dos portadores; c) identificar a origem social das pessoas portadoras e analisar se ela influi no processo de redefinição a partir do tratamento médico que lhes é dado.
Nessa perspectiva acima referida, consideramos a nossa proposta de pesquisa exeqüível, visto que o nosso objeto empírico está materializado nas pessoas portadoras vivendo com HIV-AIDS e em todo o referencial de publicações existente, o que nos permitirá o acesso para execução das etapas necessárias ao seu desenvolvimento.
Consideramos, ainda, que a pesquisa, a partir do enfoque que pretendemos desenvolver, poderá vir a dar uma importante contribuição no âmbito da análise sociológica, frente ao novo momento de reflexões acerca de seus modelos teóricos.
O PROBLEMA
A AIDS nos proporciona um momento histórico de profundas reflexões. Surgindo numa realidade social hedônica, em que o homem moderno aumentou a sua longevidade, pondo a idéia da morte cada vez mais distante de si, a AIDS aparece se inscrevendo no cenário social como um fato real e concernente a todos.
Segundo Camargo (1994), a AIDS é a epidemia que, no final do século XX, tem representações semelhantes à tuberculose, ao câncer, e traz acrescida as categorias de ser sexualmente transmissível, da ação lenta do agente etiológico e da existência de um portador sadio.
Segundo a autora acima citada, quando as grandes epidemias, a exemplo da febre amarela, da varíola, foram controladas ou foram fracamente endêmicas, sempre surgiram outras, como a gripe espanhola que afetou continentes inteiros -1918 a 1919-, trazendo grande mortalidade para todo o globo. A tuberculose foi uma dessas epidemias de caráter infeccioso. Considerada a doença do século XIX e do início do século XX, só foi identificada após dizimar muitas vidas e após longo trabalho de investigação. Pela crueldade de seus danos ela foi tida como uma peste da urbanização, da industrialização e das precárias condições de vida do proletariado.
Nas últimas décadas do século XX, surge a AIDS como a exterminadora do presente. Traz consigo o pânico da morte, o confronto com os limites humanos, com a redefinição do tempo da vida, ao mesmo tempo em que possibilita uma visão mais abrangente da mesma.
A epidemia da AIDS é formada por um conjunto de fatores que a definem e explicam de modo bastante complexo, o que, até hoje, ainda não é compreendido por um grande contingente da população. Isto pode ser justificado pelo modo como foi difícil para a própria ciência médica diagnosticar a etiologia da virose que se pressupunha, à época das primeiras investigações, serem a causadora daqueles óbitos.
Até o presente, ainda, encontramos pessoas que não crêem na existência da AIDS, atribuindo tudo a “coisas para amedrontar as pessoas”, ou como fazendo parte de um “jogo político” dos laboratórios. É um mito, uma história, ou coisa dos estrangeiros, porém, nada tem a ver conosco, etc.
As primeiras notícias sobre a AIDS chegam dos Estados Unidos em 1981, através de um órgão governamental americano: Center for Disease Control. Cidades como a Califórnia e Nova Yorque atestavam mortes de jovens e adultos masculinos que tinham em comum a homossexualidade e que ocorriam de forma inusitada, combinando raros tipos de cânceres com pneumonias comuns. Esses casos foram descritos como estados de imunodeficiência. Ou seja, uma diminuição dos recursos orgânicos tradicionalmente requisitados para manter o corpo “imune” às infecções (CAMARGO JR., 1994).
A epidemia da AIDS é, portanto, uma doença nova, tendo sido diagnosticada no princípio dos anos 80, pelos franceses e americanos. O termo “AIDS” é uma sigla originada do nome inglês: “Acquired Imune Deficiency Síndrome”, que se traduz por: “Síndrome da Imunodeficiência Adquirida” (em português também se pode chamar SIDA). O termo síndrome significa um conjunto de doenças que se manifesta em várias formas de mal-estar que aparecem juntas. No caso da AIDS, esse conjunto de doenças e sintomas pode ir de diarréias e vômitos, a gânglios inchados, sarcoma de kaposi (que é um tipo de câncer visível em doenças epidérmicas que são manchas vermelhas-), e outras patologias como, doenças respiratórias, tuberculose, herpes, toxoplasmose, perda de peso acentuada e outros. Isto é, são sintomas e doenças conhecidas que, isoladamente, não seriam tão problemáticas, nem letais, como no contexto da AIDS.
O termo Imunodeficiência configura-se na falha das defesas do organismo. Uma doença que seria simples e até inofensiva numa pessoa saudável, no caso da AIDS assume um caráter complexo e de riscos significativos.
O conjunto celular do corpo é definido pelos cientistas como o “sistema imunitário”. Esse sistema é uma massa de tecidos e células espalhadas por todo o corpo. A organização desse conjunto de células funciona de modo a proteger o corpo de infecções. A AIDS é, pois, a doença do sistema imunitário, assim como a hepatite é a doença do fígado, a gastrite é a doença do estômago, etc. Portanto, com o sistema imunitário comprometido -em imunodeficiência- as infecções podem se tornar muitos graves, mais do que realmente são. Essas infecções que se aproveitam das falhas do sistema imunitário são chamadas de infecções oportunistas (ABIA, 1994).
A palavra “adquirida” diz respeito ao aparecimento dos primeiros casos de AIDS. Segundo os patologistas, as doenças do sistema imunitário são raras. Algumas pessoas nascem com elas, outras as têm por razões desconhecidas, ou ainda, porque fizeram transplante, etc. Todavia, uma doença imunitária em caráter de epidemia, atingindo comunidades inteiras se configura em algo inédito. A imunodeficiência é, em algum momento, “adquirida” pela pessoa.
Desse modo, a AIDS é uma doença imunológica, resultante de uma infecção por um vírus que é transmissível em circunstâncias determinadas de troca íntima de fluidos do corpo. Esta troca pode ocorrer através do ato sexual, da transfusão de sangue, da gestação, do nascimento e da amamentação (idem).
O sistema imune é o alvo do assalto do HIV. O vírus é um parasita que invade e se apropria, de preferência, da máquina genética de uma célula crítica do sistema de defesa humano: a chamada T auxiliadora, que tem como função incentivar as células que fazem os anticorpos e as que ajudam a controlar as infecções por fungos e bactérias. Para poder entrar na T auxiliar, o vírus HIV utiliza proteínas que ficam na superfície dessa célula, em particular a chamada CD4.
O HIV é um retrovírus, o que significa que a sua forma de vida é a mais simples, arcaica e bruta, e é disso que a sua força deriva (Revista VEJA nov., 1996). HIV significa Human Imunedeficiency Virus (Vírus da Imunodeficiência Humana). Trata-se de um vírus que possui características muito particulares e por isso pode passar, e em muitas situações, passa despercebido por muito tempo no corpo dos seres humanos, sem se manifestar. Infecta de modo lento, não apresentando sintomas de contágio.
Portanto, dentro dessa discussão da Síndrome da Imunodeficiência Adquirida se distinguem dois estágios: um de soropositividade e, outro, de doença da AIDS. Esses são estágios diferenciados em que alguém pode ser um soro positivo assintomático por muito tempo, ou então, alguém já está com a manifestação dos sintomas da doença, é o que se considera como o estado avançado da infecção por HIV-AIDS. Essa é uma fase bem mais delicada na vida das pessoas, visto que elas se confrontam com a sua própria existência, a sua vida íntima e seus referenciais sociais na coletividade.
Diante do que está posto acerca dessa epidemia, fica notório que a AIDS se diferencia de outras já ocorridas no mundo por sua patogêneses: a AIDS é uma doença do sistema imunológico. Ela é adquirida pelo vírus HIV que ataca esse sistema celular e o enfraquece, levando as pessoas a morte. Esta é a constatação a qual tiveram, e ainda terão que chegar às populações do mundo.
Por esta constituição viral se entende, portanto, que a AIDS não é um castigo, não é um mistério, não é uma arma planejada e nem resulta de nenhum desequilíbrio. Não é nada mais do que uma epidemia, que a exemplo de tantas outras causou preocupações e pânico às populações e, também, como essas tantas outras que não foram ainda erradicadas, ficará sob a guarda da ciência médica, até que um dia o seja.
Neste ponto, uma questão bastante significativa precisa ser colocada, pois, mesmo sendo mais uma epidemia, a AIDS se diferencia muito das outras, o que leva ao questionamento sobre o que é que a torna tão diferente? O que há de subjacente a essa condição de epidemia que a torna tão apavorante? Por que as pessoas têm tanto pavor da AIDS?
De princípio, podemos afirmar que a AIDS se configura num fenômeno marcado por estigmas, o que pode ser facilmente verificado fazendo-se um resgate do período de seu surgimento. Caminho que pode apontar as respostas para essas e muitas outras questões.
Alguns estudiosos do assunto, pelo menos aqui no Brasil, tais como médicos assistentes sociais, psicólogos, psiquiatras, antropólogos, sociólogos, e demais, são unânimes em constatar que algumas das razões que explicam o estigma dessa epidemia estão calcadas em alguns conceitos nos quais se fundaram a AIDS. Dizem respeito ao modo como ela foi notificada, através da mídia, para o globo: “uma peste dos culpados” (PARKER, 1994). A AIDS era uma doença de “grupos de risco”. Esses grupos se dividiam em “vítimas” (hemofílicos) e “promíscuos” (homossexuais, prostitutas, viciados em drogas). Durante mais de dez anos, as idéias sobre esse fenômeno foram as mais distorcidas possíveis. Falava-se muito mais na pessoa que estava doente, do que na própria doença. Essas pessoas chamavam mais a atenção do que a doença (PAIVA, 1992).
A AIDS se inscreve num período da vida social em que a intimidade passa por grandes transformações. A sua caracterização inicial de doença infecto-contagiosa, incurável, mortal, vinculada em primeira instância a homossexualidade, fez o seu aporte em muitos estigmas: pessoas que se decidiram por viver a vida e a sua sexualidade de modo alternativo, seriam castigadas com a morte por AIDS.
O peso social da AIDS é muito grande. Ela se configura num fenômeno que se materializou na carne dos atores sociais, e é esse um dos fatores que a diferencia das outras epidemias. Segundo Rouet (1996:16-20), “a SIDA, mais do que qualquer outra doença, tornou-se um fenômeno social muito importante; ela transtorna a escola, a empresa, a justiça, a igreja”. Fazendo um aporte na escrita do autor, acrescentamos que ela, também, flagrou o próprio portador na sua instância identitária, nos seus grupos de pertença, tais como, a família, a religião e o trabalho. “Estar doente é ter passado por diversas etapas, é ser levado a passar por outras. Em primeiro lugar houve o anúncio da contaminação com o prognóstico, inevitável no atual estado de conhecimentos, de morte num prazo mais ou menos longo. Depois vem a fase de soropositividade sem sintomas, sem sinais físicos de doença, quando a pessoa acometida vive na expectativa ou na angústia, reorganiza seu modo de vida, durante alguns meses ou anos” (idem, ibdem).
A condição de que a pessoa é portadora de HIV-AIDS parece ser a condição sine qua non para que busquem outros modos de viver suas vidas, redefinindo novas relações com o tempo, reconstruindo novas relações afetivas, novas representações sociais e imaginárias na sua cotidianidade, novas posturas em face de sua condição de gênero, a sua vida pessoal e profissional, a seu status social, e as suas questões ontológicas e existenciais quanto a sua própria prática religiosa.
Frente ao exposto, levantamos algumas questões que consideramos pertinentes à essa temática e fundamentais como ponto de partida à investigação pretendida, e que deverão ser respondidas no decorrer da mesma. Tais questões, pois, constituir-se-ão em nosso problema de pesquisa.
Na perspectiva da problemática da AIDS exposta até aqui, que aponta para uma nova condição de vida em que as pessoas são postas a partir de um diagnóstico médico da sua infecção, poderíamos perguntar se esta nova condição determina a necessidade de uma redefinição de sua identidade coletiva e a construção de novas representações sociais e imaginárias, e se, em função desse processo, são produzidas novas experiências cotidianas na sexualidade, na família, no trabalho e na religião? Poderíamos perguntar, ainda, se o gênero, especialmente no que se refere a redefinição de prioridades, e a condição social das pessoas portadoras, evidenciada através do tratamento médico recebido, podem se constituir em elementos intervenientes desse processo de redefinição?
Para tentar responder a estas questões, partimos do pressuposto de que a nova condição de pessoa portadora desencadeia um processo de redefinição da identidade individual e coletiva, processo que se gesta em função da grande exclusão social a que são submetidas essas pessoas por parte dos seus grupos de pertença.
HIPÓTESES E VARIÁVEIS
A partir deste pressuposto, afirmamos como hipótese central de nossa investigação que os tipos de experiências das pessoas portadoras de HIV-AIDS levam-nas a produzirem redefinições da sua identidade coletiva e a construção de novas representações sociais e imaginárias na sua cotidianidade, envolvendo sua sexualidade, sua vida na família, na religião e no trabalho.
Consideramos que esse processo de redefinição se dá de forma diferenciada, a partir da intervenção de certas condições particulares a determinados grupos sociais. Na tentativa de contemplar esses aspectos em nossa investigação, tomaremos, em especial, duas dessas condições que entendemos como mais significativas para nossa análise e que denominaremos de variáveis intervenientes, a saber: a redefinição de prioridades em função do gênero e da condição social. Essas variáveis indicam, portanto, condições que podem intervir de forma mais significativa no processo de redefinição da identidade coletiva da pessoa portadora e se configuram, mais especificamente, através das seguintes hipóteses auxiliares:
1. A condição de gênero influi na redefinição das prioridades das pessoas portadoras de HIV-AIDS;
2. A qualidade do tratamento médico prestado as pessoas portadoras do HIV-AIDS depende de sua condição social e materializa o seu status, influenciando na redefinição de suas instâncias identitárias.
REFERENCIAL TEÓRICO
A ciência se caracteriza, por um lado, pela produção do conhecimento e, por outro, pela produção de mecanismos que buscam a validação dessa produção. Fazer ciência social, portanto, significa produzir conhecimentos válidos, úteis à explicação dos fenômenos sociais, nas diversas instâncias disciplinares de investigação.
Nesta direção, para se dar conta de uma produção científica, faz-se essencial a utilização de um conjunto de instrumentos teórico-metodológicos que referendem as práticas das diversas fases da pesquisa. Teóricos como Chalmers (1993), Kuhn (1989), são rigorosos na discussão que aponta para a necessidade de observação desses critérios, tomando-os como condição sine qua non à construção do conhecimento científico.
Na pesquisa pretendida, nosso intento será o de tomar essa discussão como questão substancial, dando um tratamento rigoroso para as análises conceituais do objeto empírico, construindo categorias no marco universal da ciência de maneira que as mesmas venham a dar conta da comprovação das hipóteses propostas, objetivo principal de todo trabalho científico.
Em nosso estudo, no que se refere à hipótese principal, na qual procuramos estabelecer uma relação de determinação entre a condição de pessoa portadora de HIV-AIDS e a redefinição da sua identidade coletiva e, necessariamente, a construção de novas representações sociais e imaginárias, será fundamental definir as categorias conceituais formadoras do nosso conjunto de variáveis, a saber: a) identidade coletiva; b) representação social; e c) imaginário social. A definição dessas categorias deverá se constituir numa atividade importante a ser realizada durante o desenvolvimento do projeto, indicando o marco principal para a operacionalização dos conceitos que iremos trabalhar. Na operacionalização dos conceitos, pretendemos, portanto, fazer um mapeamento das perspectivas teóricas de alguns autores que discutem estes conceitos, a exemplo de Serge Moscovici, Cornelius Castoriadis, e outros.
Ainda no que se refere as hipóteses, precisamos considerar as hipóteses auxiliares identificadas no item anterior. Estas foram construídas a partir da relação que conseguimos estabelecer entre as variáveis da hipótese principal e outras variáveis, que denominaremos de variáveis intervenientes.
Para uma melhor visualização da relação entre as variáveis, apresentamos o esquema a seguir:
VARIÁVEL INDEPENDENTE (A) VARIÁVEL INDEPENDENTE (B)
-condição de portador de HIV-AIDs -redefinição da identidade coletiva e
construção de novas representações sociais
e imaginárias
VARIÁVEL INTERVENIENTE ©
-definição de prioridades em função de gênero e condição social
A relação entre as três variáveis contempla os seguintes aspectos:
l. A variável A é determinante da variável B
2. A variável A é determinante da variável c
3. A variável c é determinante de B.
Denominamos a variável c de variável interveniente por se constituir numa conseqüência da variável independente e determinante da variável dependente.
No caso das hipóteses que estão sendo propostas, podemos afirmar que a VARIÁVEL INTERVENIENTE se coloca entre as variáveis INDEPENDENTES (A) e DEPENDENTE (B), com a função de esclarecer a influência de A sobre B.
Podemos afirmar, portanto, que a variável A -condição de portador- é determinante de B - redefinição da identidade. Que a variável A -condição de portador - é determinante de c. Ou seja, a redefinição das prioridades da vida das pessoas em função do gênero e da condição social, se encontra numa relação de dependência da constatação de sua condição de portador. E que, a variável B é determinada pela variável A e c.
Neste ponto, cabe uma discussão acerca de cada um dos aspectos envolvidos nas hipóteses que estamos propondo, bem como das variáveis que estamos apresentando em função da operacionalização das hipóteses. Afirmamos, de princípio, que os tipos de experiências das pessoas portadores de HIV-AIDS levam-nas a produzirem redefinições das suas representações sociais e imaginárias na sua cotidianidade, no campo pessoal, na família, na religião e no trabalho. Esses tipos de experiências materializam a existência de dois momentos bem distintos da vida dessas pessoas. Um, antes do diagnóstico médico, que se define pelo modo como elas vivem a sua vida, pelas escolhas que fizeram até o presente momento, etc., e outro que passará a ser produzido após o diagnóstico médico da sua soropositividade ou doença de AIDS. A partir dessa nova condição que lhes é imposta por esse novo quadro, elas se percebem numa situação bastante delicada e entram num grande conflito existencial.
Geralmente vão buscar as experiências vividas no passado, procurando descobrir em que tempo de suas vivências se deu o seu contágio, ou de que modo elas podem ter sido infectadas. Todos os tipos de experiências são revistas, assim como as escolhas feitas, as relações sociais produzidas, e o confronto com “o que fazer agora”? De acordo com alguns depoimentos citados em autores, tais como: Camargo (1994); Paiva (1992); Rouet (1996), bem como em documentários, artigos em jornais e revistas, esse fato é passivo de ser constatado sem grandes dificuldades.
Dar um novo sentido a vida é a necessidade com a qual todos se deparam. Sentimentos de ordens diversas emergem, os laços sociais são estremecidos, os laços afetivos se quebram, ou se fortalecem. A crise de solidão é intensa, e como conseqüência nasce a insegurança quanto ao futuro. É justamente a partir desse estágio que nasce a necessidade de uma redefinição das instâncias identitárias: no plano individual e no plano da coletividade, novas representações sociais e imaginárias nascerão desse momento.
Nas outras duas hipóteses que nós levantamos as quais consideramos como hipóteses auxiliares, afirmamos a existência de dois aspectos que, a nosso ver, influi na redefinição das prioridades dessas pessoas, influenciando no seu processo de redefinição de identidade coletiva e na construção de novas representações sociais e imaginárias. Esses aspectos são o gênero e a condição social de cada uma delas,
No trato da questão do gênero, consideramos que esta condição influi na redefinição de algumas prioridades que passam a ser relevantes, tais como: o papel do outro na vida da pessoa portadora, a redefinição do que deve ser priorizado após essa nova condição na vida afetiva; os rumos que se darão às práticas sexuais; e também o fato da AIDS forçar um novo olhar dos sexos sobre a vida. As questões da sexualidade são postas com grande ênfase, apontando para a necessidade de uma discussão sobre a intimidade. Neste sentido, os vínculos da afetividade, a qualidade e o modo de vida íntima dos parceiros, são postos em cheque.
No que se refere a qualidade do tratamento médico dado à essas pessoas portadoras, momento significativo na percepção da condição social de suas vidas, podemos verificar que ele não é feito do mesmo modo para todos. Os serviços públicos de saúde oferecidos para todos, em muitos casos, tornam-se ineficientes para atender uma pessoa portadora de condição social elevada, levando-a a procurar a rede privada, o que materializa um tratamento diferenciado entre as pessoas portadoras e, conseqüentemente, interferirá na forma como essas pessoas vão lidar com uma série de questões em sua vida. Esse é apenas um dos aspectos abordados aqui.
Tem-se que discutir, também, o papel do médico na relação com o paciente, especialmente no que se refere ao tratamento que é dado aos mesmos em face de condição social que cada um apresenta. Nesse sentido, entram as questões do atendimento hospitalar, do acesso ao tratamento médico, da aquisição dos medicamentos e dos preconceitos dos médicos em face de essas pessoas, no campo econômico e na sexualidade.
Outros aspectos que pretendemos tratar dentro dessa temática se expressam nas relações sociais das pessoas portadoras quanto ao seu grupo familiar, a sua religião, se pratica alguma, aos seus trabalhos e a sua vida pessoal no aspecto da sexualidade.
Em conclusão, “a produção do conhecimento científico pode analogicamente ser vista como tantos outros ciclos produtivos” (Camargo Jr. 1994:25). Tomar um tema específico dentro da problemática da AIDS e categorizá-lo cientificamente significa dar a esse fenômeno um caráter de seriedade e validade rigoroso no campo da ciência.
Portanto, reconhecer na AIDS construções metodológicas categorizáveis a partir do enfoque teórico-sociológico, visto que essa forma de enfoque não nega a sua característica terapêutica de doença muito grave que se manifesta nas manifestações patológicas dos seres humanos, como poderiam pensar algumas pessoas, e sim, abre as expectativas para a discussão desse tema, no âmbito de uma nova abordagem da ciência, fato que poderá se constituir numa contribuição importante para o vislumbramento das soluções concretas para o problema.
METODOLOGIA
Diante da abordagem temática em questão, pretendemos conduzir a investigação em dois momentos.
No primeiro momento, tomaremos como referência da análise:
a) os documentos em que são definidos os programas para divulgação, tratamento e acompanhamento, etc.., da questão AIDS;
b) as propagandas veiculadas pelos órgãos oficiais, e outros correlatos, na imprensa televisiva, tomando como proposição básica a conduta das pessoas portadoras face a essas propagandas;
c) os filmes (históricos e documentários) produzidos pela imprensa cinematográfica, procurando identificar nas representações dos atores situações similares a realidade concreta das pessoas portadoras. Temas e discussões que pressupomos se materializarão na investigação empírica. Esses dados serão relativos ao período 1990-1996.
No segundo momento, trabalharemos com a população de pessoas portadoras que esteja recebendo atendimento em um hospital de referência e em uma Organização Não Governamental (ONG), na Região Metropolitana do Recife. Atualmente são oito os locais entre hospitais e núcleos de acompanhamento na prevenção oficialmente existentes. Quanto as ONGs, que também prestam atendimento relevante tanto na prevenção como na intervenção, temos o FÓRUM-AIDS, a ASAS, a GESTOS, dentre outras.
Para tanto, pretendemos proceder da seguinte forma: tomar uma amostra representativa do universo amostral total, segundo os critérios formais da metodologia da pesquisa científica; a partir da definição da amostra, fazer a análise de dados, usando as técnicas da análise qualitativa, através de entrevistas com perguntas abertas e semi-estruturadas. Para a análise dos dados, faremos o aporte nos teóricos que tratam dessa técnica, a exemplo de Haguette (1987), Miles e Huberman (1994).
Os conteúdos das entrevistas serão definidos de acordo com a categorização da população amostral, que será realizada em função de dois grupos fundamentais: grupo 1.soropositivos assintomáticos, e grupo 2. Portadores da doença. Esta população será composta por pessoas jovens e adultas, de ambos os sexos.
As entrevistas terão um universo de conteúdo que buscará investigar as experiências de vida das pessoas portadoras antes e depois do diagnóstico médico, no intento de identificar suas instâncias identitárias nesses dois contextos de forma comparativa.
CONCLUSÃO
Este Projeto será desenvolvido como a ferramenta instruemntal para a coleta de dados no campo empírico, que serão duas ONGs, previamente escolhidas. Essas ONGs funcionarão como um conselho de ética na pesquisa, visto que os recursos metodológicos que serão usados, deverão estar em consonância com a realidade de vida da população alvo da pesquisa, que são pessoas portadoras de vírus HIV/Aids. Em princípio disponibilizaresmo o Projeto para que os sociólogs e coordenadores analisem todo o texto e os procedimentos metodológicos, como: questionário de entrevistas e outros procedimentos para tratar com o público que será entrevistado. O tempo da pesquisa será aproximadamente de dois meses, sendo que antes de começar a pesquisa faremos o pré-teste, a partir do qual estaremos corrigindo o texto do questionário. Esse pré-teste constará de entrevistar duas pessoas para apreender se o quetionária corresponde ao que se está querendo analisar.
Por fim, os dados coletados serão analisados, nos modes da análise qualitativa e também do material bibliográfico que será utilizado como a fonte literaria e teórica onde se encontrará as explicações que nos daram condições de saber se as nossas hipótese e variáveis estão certas ou erradas.
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