quarta-feira, 7 de março de 2012

Amor, Símbolo da Perfeição?





“A QUEM OUSA AMAR”

“Amor... Alguns poetas dizem ser bicho traiçoeiro, causador das mais complexas, estranhas, doloridas e avassaladoras emoções. Certamente os historiadores dirão que por causa dele reinos foram invadidos, princesas foram seqüestradas, famílias de nobres e plebeus se misturaram ou foram divididas. Outros tantos, quem sabe mais desiludidos ou decepcionados, já alegam não existir o amor e usam a desculpa científica de classificá-lo apenas como um conjunto de combinações químicas e hormonais que evoluiu a fim de garantir [ou atrapalhar] a preservação da espécie humana e tentam se livrar desta euforia de amar a todo custo.

Seja como for, aos teimosos e corajosos que ousarem enfrentá-lo, e também a quem ainda tem medo ou dúvidas, tenho algumas considerações a fazer...

Já fui vítima tanto de amar de mais, como de amar de menos. Já fui pego de surpresa com medo de não ser amado e também de não estar amando. Já me frustrei, já chorei já me arrependi... Já me precipitei e travei tantas vezes que nem sei contar. Já falei antes de pensar e já pensei sem falar... Entretanto já me alegrei e vi bichinhos, corações e o rosto da pessoa amada nas nuvens muitas outras vezes ao som de suspiros e canto de passarinhos imaginários.

Quem ousa amar tem de fazê-lo de peito aberto, sem reservas, assumindo o risco sim! Não ame querendo amor em troca! Apenas ame e se dedique no fazê-lo! Amor não é moeda ou investimento, não espere ser amado apenas porque você também ama. Vá amando, se entregando, se abrindo por completo. Quem ama por querer amor em troca, invariavelmente, acaba se frustrando muito, porque confunde amor com carência afetiva, o que definitivamente não é nada bom. Geralmente estas pessoas só conseguem perceber amor com atitudes e devoções iguais as suas próprias e não conseguem sentir o amor dito ou oferecido de uma forma diferente da sua.

Há quem diga que não devemos nos apaixonar que não se deve dizer “eu te amo!”, não se deve amar com o coração assim tão aberto, que deve se mantiver certa razão e distância segura para não correr o risco da vulnerabilidade, da exposição a um amor não correspondido ou ofendido. Eu discordo! Tal discurso só revela a infantilidade de não conseguir suportar um “não” ou o medo da dor, como aqueles adultos patéticos que ainda hoje têm medo de injeção.

Amor só é amor mesmo, quando vivido plena, apaixonado, verdadeiro, confiante e libertadoramente; com aquela sensação inconfundível de eternidade de bem. Ele não precisa vir todo de uma só vez, mas pode ser cultivado, tratado, afagado, regado como uma plantinha. Pode começar de um sorriso, de um carinho, de um abraço e ir crescendo lentamente até virar encanto, admiração, poesia, beijo, saudade e aquela vontade irresistível de passar horas e horas com a pessoa amada mesmo que ela tenha outros motivos para viver ou coisas a fazer além de estar com você.

Ame, ame muito! Mas, ame com foco! A única responsabilidade que se deve ter ao amar com tanta intensidade é o compromisso com a verdade, a lealdade e a fidelidade. Procure identificar a diferença entre o amor companheiro e a simples aflição de tesão passageira. Esta é a única hora em que o coração deve obrigatoriamente dar lugar à razão. Quem ama certamente se entorpecem de desejos, sonhos e pensamentos ofegantes. Não é pecado, muito pelo contrário, faz bem, é saudável querer se entregar ao amor, mas ele se plenifica e ganha raízes profundas seguras na alma e se completa somente à medida que damos prioridade e exclusividade a quem se ama.

Aqueles que vivem de tesão e não de amor indubitavelmente tornar-se-ão pessoas amargas e enrijecidas, carcomidas de bichos por dentro e frígidas de alma no futuro. Poderão contabilizar até um grande número de conquistas, coitos, cafajestagens e admiração sexual, mas doloridas e machucadas por dentro de falta de amor genuíno, doado e compartilhado até as últimas conseqüências.

É muito fácil cometer este equívoco, a confusão pode começar de modo muito sutil, mas a fidelidade não é a falta de atração/tentação sexual por outra pessoa além daquela a quem amamos, mas sim a escolha madura, racional e objetiva de amar escolhendo até mesmo orientar nossos desejos mais íntimos em direção a quem amamos.

Não espere também que os amores do passado se repitam, ou seja, encontrados e buscados nas novas relações, não permita fantasmas! Viva um amor de cada vez! Não tenha medo ou reservas em se dedicar com exclusividade.

Por outro lado, confie sempre! O coração prega muitas peças em quem tem medo de amar. Um gesto de amor do(a) companheiro(a) pode facilmente ser confundido com desamor ou desafeto. Antes de julgar, aprenda a depositar confiança mesmo que as aparências digam o contrário. O amor tende a se enfraquecer muito quando há desconfianças sejam elas fundadas ou infundadas.

Aos que já encontraram um grande amor, digo que é muito fácil perder a admiração e o ar de fantasia com o tempo... Aquele vulcão da conquista e das descobertas amorosas pode dar lugar a um lago tranqüilo e às vezes até monótono. Mas o amor é o caminho entre o vulcão e o lago mesmo, tanto faz em que direção você queira ir o importante é não parar de andar de mãos dadas. O príncipe às vezes pode virar um sapo e a cinderela voltar pra casa com uma abóbora ao invés da carruagem, mas vão depender do trabalho árduo e dedicado dos dois outrora intensos amantes a conquista e a reconquista diária da fantasia inicial, do vulcão e dos momentos de perder o fôlego. Há coisas muito interessantes tanto no vulcão como no lago, o gostoso não é estar lá ou aqui, o bom e prazeroso é o esforço correspondido para continuar a caminhar juntos. Em outras palavras, não se permita perder a capacidade de se surpreender com a pessoa amada mesmo nas coisas mais corriqueiras e normais!

Encontrar alguém que queira andar de mãos dadas com a gente e queira espontaneamente dar este mesmo amor sem medidas é um presente de Deus a ser valorizado e agradecido todos os dias.

Aos que ainda não encontraram... Alguns conselhos: ame primeiro a você, cuide-se, enfeite-se, curta-se, valorize-se, encontre o prazer da autossuficiência de não precisar de nada além de você mesmo para se sentir uma pessoa amável [com capacidade de ser amada], aprenda a não ter medo de se amar e investir em projetos pessoais. Em segundo lugar, seja menos exigente com você e principalmente com quem se propõe a amá-lo (a), não existe amante perfeito, nem mesmo você conseguiria sê-lo. Então, não digo que você deva se conformar cegamente com o que conseguiu [ou não] até aqui, como se você não fosse capaz de encontrar algo melhor, mas não inicie sua procura buscando alguém ou um amor à sua altura, pode ser decepcionante. Para falar a verdade, nem procure! Deixe o amor surgir naturalmente! Por fim, não fique medindo ou comparando sensações, não avalie a importância de alguém na sua vida pela sensação que ela lhe causa, mas pelo bem que ela pode provocar. Resumindo... Apenas se abra sem medo ao amor. O resultado da descoberta só vem com o tempo. Sim! É um risco!”
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Desconheço a Autoria dessa bela Reflexão.
Mas, estou postando-a aqui porque nesses últimos dias estou sensiblizida, muito mexida mesmo, por acontecimentos dolorosos que vieram a interromper a vida de pessoas lindas, a quem eu amei e amarei para sempre aqui em meu estado.
MIRIAM FIALHO
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sexta-feira, 17 de fevereiro de 2012

domingo, 12 de fevereiro de 2012

Reflexão Poética




VIVER NÃO DÓI
Definitivo, como tudo o que é simples.
Nossa dor não advém das coisas vividas,
mas das coisas que foram sonhadas
e não se cumpriram.
Por que sofremos tanto por amor?
O certo seria a gente não sofrer,
apenas agradecer por termos conhecido
uma pessoa tão bacana, que gerou
em nós um sentimento intenso
e que nos fez companhia por um tempo razoável,
um tempo feliz.
Sofremos por quê?
Porque automaticamente esquecemos
o que foi desfrutado e passamos a sofrer
pelas nossas projecções irrealizadas,
por todas as cidades que gostaríamos
de ter conhecido ao lado do nosso amor
e não conhecemos,
por todos os filhos que
gostaríamos de ter tido junto e não tivemos,
por todos os shows e livros e silêncios
que gostaríamos de ter compartilhado,
e não compartilhamos.
Por todos os beijos cancelados,
pela eternidade.
Sofremos não porque
nosso trabalho é desgastante e paga pouco,
mas por todas as horas livres
que deixamos de ter para ir ao cinema,
para conversar com um amigo,
para nadar, para namorar.
Sofremos não porque nossa mãe
é impaciente conosco,
mas por todos os momentos em que
poderíamos estar confidenciando a ela
nossas mais profundas angústias
se ela estivesse interessada
em nos compreender.
Sofremos não porque nosso time perdeu,
mas pela euforia sufocada.
Sofremos não porque envelhecemos,
mas porque o futuro está sendo
confiscado de nós,
impedindo assim que mil aventuras
nos aconteçam,
todas aquelas com as quais sonhamos e
nunca chegamos a experimentar.
Como aliviar a dor do que não foi vivido?
A resposta é simples como um verso:
Se iludindo menos e vivendo mais!!!
A cada dia que vivo,
mais me convenço de que o
desperdício da vida
está no amor que não damos,
nas forças que não usamos,
na prudência egoísta que nada arrisca,
e que, esquivando-se do sofrimento,
perdemos também a felicidade.
A dor é inevitável.
O sofrimento é opcional.

(Carlos Drummond de Andrade)

sábado, 21 de janeiro de 2012

ENRIQUECENDO A REFLEXÃO

CARTA
Meu caro poeta,
Por um lado foi bom que me tivesses pedido resposta urgente, senão eu jamais escreveria sobre o assunto desta, pois não possuo o dom discursivo e expositivo, vindo daí a dificuldade que sempre tive de escrever em prosa. A prosa não tem margens, nunca se sabe quando, como e onde parar. O poema, não; descreve uma parábola traçada pelo próprio impulso (ritmo); é que nem um grito. Todo poema é, para mim, uma interjeição ampliada; algo de instintivo, carregado de emoção. Com isso não quero dizer que o poema seja uma descarga emotiva, como o fariam os românticos. Deve, sim, trazer uma carga emocional, uma espécie de radioatividade, cuja duração só o tempo dirá. Por isso há versos de Camões que nos abalam tanto até hoje e há versos de hoje que os pósteros lerão com aquela cara com que lemos os de Filinto Elísio. Aliás, a posteridade é muito comprida: dá-me sono. Escrever com o olho na posteridade é tão absurdo como escreveres para os súditos de Ramsés II, ou para o próprio Ramsés, se fores palaciano. Quanto a escrever para os contemporâneos, está muito bem, mas como é que vais saber quem são os teus contemporâneos? A única contemporaneidade que existe é a da contingência política e social, porque estamos mergulhados nela, mas isto compete melhor aos discursivos e expositivos, aos oradores e catedráticos. Que sobra então para a poesia? - perguntarás. E eu te respondo que sobras tu. Achas pouco? Não me refiro à tua pessoa, refiro-me ao teu eu, que transcende os teus limites pessoais, mergulhando no humano. O Profeta diz a todos: "eu vos trago a verdade", enquanto o poeta, mais humildemente, se limita a dizer a cada um: "eu te trago a minha verdade." E o poeta, quanto mais individual, mais universal, pois cada homem, qualquer que seja o condicionamento do meio e e da época, só vem a compreender e amar o que é essencialmente humano. Embora, eu que o diga, seja tão difícil ser assim autêntico. Às vezes assalta-me o terror de que todos os meus poemas sejam apócrifos!
Meu poeta, se estas linhas estão te aborrecendo é porque és poeta mesmo. Modéstia à parte, as disgressões sobre poesia sempre me causaram tédio e perplexidade. A culpa é tua, que me pediste conselho e me colocas na insustentável situação em que me vejo quando essas meninas dos colégios vêm (por inocência ou maldade dos professores) fazer pesquisas com perguntas assim: "O que é poesia? Por que se tornou poeta? Como escrevem os seus poemas?" A poesia é dessas coisas que a gente faz mas não diz.
A poesia é um fato consumado, não se discute; perguntas-me, no entanto, que orientação de trabalho seguir e que poetas deves ler. Eu tinha vontade de ser um grande poeta para te dizer como é que eles fazem. Só te posso dizer o que eu faço. Não sei como vem um poema. Às vezes uma palavra, uma frase ouvida, uma repentina imagem que me ocorre em qualquer parte, nas ocasiões mais insólitas. A esta imagem respondem outras. Por vezes uma rima até ajuda, com o inesperado da sua associação. (Em vez de associações de idéias, associações de imagem; creio ter sido esta a verdadeira conquista da poesia moderna.) Não lhes oponho trancas nem barreiras. Vai tudo para o papel. Guardo o papel, até que um dia o releio, já esquecido de tudo (a falta de memória é uma bênção nestes casos). Vem logo o trabalho de corte, pois noto logo o que estava demais ou o que era falso. Coisas que pareciam tão bonitinhas, mas que eram puro enfeite, coisas que eram puro desenvolvimento lógico (um poema não é um teorema) tudo isso eu deito abaixo, até ficar o essencial, isto é, o poema. Um poema tanto mais belo é quanto mais parecido for com o cavalo. Por não ter nada de mais nem nada de menos é que o cavalo é o mais belo ser da Criação.
Como vês, para isso é preciso uma luta constante. A minha está durando a vida inteira. O desfecho é sempre incerto. Sinto-me capaz de fazer um poema tão bom ou tão ruinzinho como aos 17 anos. Há na Bíblia uma passagem que não sei que sentido lhe darão os teólogos; é quando Jacob entra em luta com um anjo e lhe diz: "Eu não te largarei até que me abençoes". Pois bem, haverá coisa melhor para indicar a luta do poeta com o poema? Não me perguntes, porém, a técninca dessa luta sagrada ou sacrílega. Cada poeta tem de descobrir, lutando, os seus próprios recursos. Só te digo que deves desconfiar dos truques da moda, que, quando muito, podem enganar o público e trazer-te uma efêmera popularidade.
Em todo caso, bem sabes que existe a métrica. Eu tive a vantagem de nascer numa época em que só se podia poetar dentro dos moldes clássicos. Era preciso ajustar as palavras naqueles moldes, obedecer àquelas rimas. Uma bela ginástica, meu poeta, que muitos de hoje acham ingenuamente desnecessária. Mas, da mesma forma que a gente primeiro aprendia nos cadernos de caligrafia para depois, com o tempo, adquirir uma letra própria, espelho grafológico da sua individualidade, eu na verdade te digo que só tem capacidade e moral para criar um ritmo livre quem for capaz de escrever um soneto clássico. Verás com o tempo que cada poema, aliás, impõe sua forma; uns, as canções, já vêm dançando, com as rimas de mãos dadas, outros, os dionisíacos (ou histriônicos, como queiras) até parecem aqualoucos. E um conselho, afinal: não cortes demais (um poema não é um esquema); eu próprio que tanto te recomendei a contenção, às vezes me distendo, me largo num poema que vai lá seguindo com os detritos, como um rio de enchente, e que me faz bem, porque o espreguiçamento é também uma ginástica. Desculpa se tudo isso é uma coisa óbvia; mas para muitos, que tu conheces, ainda não é; mostra-lhes, pois, estas linhas.
Agora, que poetas deves ler? Simplesmente os poetas de que gostares e eles assim te ajudarão a compreender-te, em vez de tu a eles. São os únicos que te convêm, pois cada um só gosta de quem se parece consigo. Já escrevi, e repito: o que chamam de influência poética é apenas confluência. Já li poetas de renome universal e, mais grave ainda, de renome nacional, e que no entanto me deixaram indiferente. De quem a culpa? De ninguém. É que não eram da minha família.
Enfim, meu poeta, trabalhe, trabalhe em seus versos e em você mesmo e apareça-me daqui a vinte anos. Combinado?
(Texto de Mario Quintana)

sexta-feira, 6 de janeiro de 2012

Outro Lindo Poema











Exortação

Sonha, poeta!... O sonho é o entorpecente,
o mais sublime tóxico do mundo,
a morfina ideal do teu viver...
-sonha um sonho infinito, azul, profundo,
indefinidamente,
e esquece a vida que tu tens presente
pela vida maior que há no teu Ser!

Esquece tudo, o próprio mundo esquece,
e esquece a tua vida, porque a tua vida
vale mais se a souberes fazer grande
e cada vez maior
na tua exortação...
Se o teu destino é estranho e é diferente,
se não nasceste igual a toda gente,
- ensina o canto livre e a vida nova
aos Prometeus da Razão!

Faze tu mesmo, o teu próprio Universo,
- tua terra
- teu céu
- tua vida
- teu verso...
E o Universo dos homens que te importa então?
Sê louco!... Que a loucura é essa subida
de pequenez restrita da verdade
à grandeza infinita da Ilusão!

O teu sonho não traz o pedestal na terra,
teu espírito é assim como um condor boiando
nos espaços azuis...
Sobe... devassa os céus, de lado a lado,
vê se existe algum poeta, além, por outros mundos,
esse poeta que à noite escreve com as estrelas,
não tendo ao solo acorrentado os pés!

Sonha, poeta!... Eu quero ver-te aflito
sacudir os teus braços na amplidão
a ferir com teus dedos o Infinito...

E ao baixar tuas mãos,
de novo ao vê-las,
hás de exclamar, tenho-as de ouro e lilás!;
e olhando para o céu
verás o céu sangrando
de estrelas,
e as tuas mãos, a transbordar estrelas
assombrado verás!

Não trouxeste o destino de arrastar
a tua ânsia na terra
onde os homens pregados vão de rastros...

Solta a tua alma azul no espaço azul,
os teu sonhos semelham-se a bandeiras
fremindo ao vento no cordel dos mastros!
- vai brincar com os cometas sem destino
e conversar com os astros!

Sonha! Que este sonhar só bem te faz!
Sê sempre o mesmo:
Um louco!
Um incomum!
Não te sujeites a domínio algum,
e que o teu sonho não acabe mais!

( JG de Araujo Jorge )

quinta-feira, 29 de dezembro de 2011

SEMINÁRIO NACIONAL FEMINISTA



SEMINÁRIO NACIONAL FEMINISTA
APROFUNDANDO O DEBATE SOBRE AIDS –
Ano II

O Seminário Nacional Feminista Aprofundando o Debate sobre AIDS – Ano II foi realizado pelo SOS Corpo Instituto Feminista para Democracia, em parceria com o Grupo de Trabalho em Prevenção PositHIVa(GTP+)/PE , Movimento Nacional de Cidadãs PositHIVa(MNCP-PI) / PI, Coletivo Leila Diniz/RN, nos dias 07 e 08 de outubro de 2011, em Recife/PE. Seu objetivo foi o de contribuir com a elaboração de reflexões críticas sobre as condições de vida, saúde, moradia e trabalho das mulheres e própria vivência da soropositividade para o HIV/AIDS e as respostas de enfrentamento dos vários sujeitos políticos em atuação nos movimentos sociais. Estiveram presentes aproximadamente 160 mulheres que atuam no movimento feminista, movimento de luta contra AIDS e noutros movimentos sociais, ONGs, sindicatos, em espaços gestão pública, profissionais de saúde, professoras, conselhos de políticas públicas, universidades, entre outros.
Durante os dois dias foram aprofundadas reflexões e apontados desafios sobre: corpo, AIDS e os efeitos dos medicamentos; violência contra as mulheres e a feminização da AIDS; AIDS e condições de vida das mulheres: moradia, trabalho e renda; vivencia da AIDS e a organização política das mulheres; relações familiares e epidemia da AIDS: afetos e conflitos. A seguir compartilhamos nossos pensamentos

CORPO, AIDS E OS EFEITOS DOS MEDICAMENTOS
O que pensamos sobre Corpo, AIDS e os Efeitos dos Medicamentos?
Historicamente a mulher sofreu e ainda sofre a opressão da sociedade capitalista, da ciência e da tecnologia sobre o corpo, ou seja, há uma normatização, que se refletem por meio das cobranças, cirurgias e medicamentos. Há uma cobrança da sociedade sobre o corpo da mulher, construindo um padrão de beleza;
No contexto social há uma desigualdade quanto à expressão do corpo masculino e feminino. Esta opressão acarretou o desconhecimento o seu corpo, dificultando assim a prevenção, sobretudo do uso da camisinha feminina. Outra questão bastante importante é que o conhecimento do próprio corpo contribuir para entender os efeitos colaterais dos remédios Anti-Retrovirais;
A Lipodistrofia produzida pelo vírus HIV e ou pelo efeito dos medicamentos trás mudanças no corpo feminino, trazendo assim maior sofrimento para mulheres que vivem com AIDS porque o seu corpo fica fora dos padrões femininos cobrados pela sociedade;
A produção dos medicamentos para AIDS não investe na pesquisa sobre o efeito no corpo feminino. A maioria das mulheres vivendo com AIDS passam pelo sofrimento de transformação do corpo devido aos medicamentos. Os remédios não são adequados as particularidades das mulheres: menstruação, gravidez, amamentação dentre outras. As mulheres são mais afetadas pela diabetes e hepatites C. Quanto aos aspectos ginecológicos, muitas mulheres têm hemorragias, falta de apetite sexual, ressecamento da vagina, dores durante a relação sexual, candidíase, diminuição libido, além de não poder amamentar;
Mesmo com 30 anos da epidemia, ainda é grande o desrespeito do profissional de saúde, em especial médicos/as quanto aos direitos reprodutivos das mulheres com HIV: “você tem AIDS, então porque você quer ter filho?”;
A rejeição das pessoas com HIV ao seu estado sorológico, trás problemas psicológicos, revelando o momento da culpa que gera um bloqueio da sexualidade e que não está relacionado só com o medicamento;
Preconceitos e tabus ainda existentes dificultam a prevenção, contribuindo para o aumento dos casos de AIDS ente mulheres, principalmente entre as jovens;
A cultura do machismo impõe que a relação sexual prazerosa é com penetração, especialmente para mulher. É preciso desconstruir este mito e buscar outras formas de prazer.
A AIDS revela que a prática sexual o ser humano continua privada e vão de encontro as normatizações das formas sexuais padronizadas e legitimada pela sociedade;
Há uma imensa dificuldade de desenvolver ações de luta contra AIDS com comunidades rurais e indígenas, principalmente com as mulheres. As mensagens das campanhas do Ministério da Saúde não alcançam a realidade desses territórios;
Existem duas formas de se ver AIDS, doença e saúde. Uma delas é a fala do profissional e outra é a das pessoas vivendo com HIV. São duas falas diferentes, momentos diferentes. Há uma reclamação dos profissionais pela não adesão, sem saber da realidade dos usuários, como os mesmos vivem, se tem alimentos, como é a relação com a família, os efeitos colaterais e etc. A escuta das/os médicas/os, a autonomia das/os pacientes principalmente, diante do médico/a são as melhores estratégias para a transformação da relação médico e pessoa vivendo com HIV;
A AIDS é uma questão do Estado e não só das pessoas vivendo com HIV;
O uso da camisinha vai além das questões técnicas. Se o só “use a camisinha” funcionassem, todas/os usavam, mas tem as questões do corpo, da subjetividade. Não dá pra pensar em corpo, AIDS e medicamentos sem pensar no sujeito integral.
Quais são os desafios para nós mulheres sobre a questão?
O desafio das mulheres de enfrentar do pertencimento do corpo na sociedade patriarcal capitalista;
A mulher necessita conhecer o seu corpo. Pensar o campo da prevenção é nos desafia ar conhecer nosso próprio corpo;
Construir estratégias para aprofundar o diálogo entre nós mesmas sobre corpo, sexualidade, prazer para desconstruir tabus;
O que mais nos desafia enquanto mulheres é o que está normatizado. O preservativo é importante, mas ainda não foi incorporado para além da prevenção a uma doença e ou a gravidez, não está associado ao prazer, por exemplo. O desafio é discutir sem dizer FAÇA! USE CAMISINHA! Com isso nem sempre nos sentimos estimuladas e ou com desejo de usá-lo, é importante aprofundar debates sobre prevenção entre as mulheres associando: direito, conhecimento do corpo, autonomia, prazer, práticas sexuais, entre outras questões;
Fortalecer a luta por preservativo feminino. O que está disponível em grande número é o masculino, mas muitos homens não querem usar e muitas mulheres vivendo com HIV /AIDS apresentam desconforto por causa do ressecamento da vaginal. A disponibilização da camisinha feminina na rede pública de saúde é mínima.
Influenciar na construção de uma política de Estado que considere as mulheres vivendo com HIV na sua integralidade;
O movimento feminista precisa investir na integralidade das ações que considere as questões como: violência; sexualidade; AIDS e corpo;
Desconstruir a cultura do machismo que impõe regras sobre a sexualidade feminina;
Continuarmos com a luta feminista sobre autonomia do nosso corpo, fortalecendo a ampliação com mulheres das comunidades, universidades, profissionais da saúde e outros segmentos;
Trabalhar a auto-estima das mulheres nas comunidades para que elas possam construir a autonomia sobre si, sobretudo sobre sua saúde, sexualidade, para que possam se prevenir das doenças sexualmente transmissíveis;
Elaborar metodologias que contribuam para a abordagem sobre corpo, medicamentos, AIDS nas comunidades rurais, indígena, entre outras;
É preciso que haja uma troca de conhecimento de experiências entre o profissional da saúde e as pessoas vivendo com HIV, em especial as mulheres, a cerca da realidade das pessoas vivendo com HIV, para encontrar estratégias de adesão ao medicamento, sobretudo compreender a não adesão;
Pautar na luta feminista a questão sobre a pesquisa dos efeitos dos medicamentos no corpo das mulheres;
Priorizar a escuta e respeitar a realidade de nós mulheres como elementos importantes para construção de reflexão e para a ação transformadora;
Construir meios para que nossas reflexões e debate estejam presentes nas ações do Plano de Enfrentamento a Feminização da AIDS;
Produzir materiais de informação que revelam a realidade das mulheres jovens, adultas e idosas.
VIOLÊNCIA CONTRA AS MULHERES E A FEMINIZAÇÃO DA AIDS
O que pensamos sobre a violência contra as mulheres e a feminização da AIDS?
A violência contra as mulheres contribui para o aumento da violência contra as mulheres;
A violência contra as mulheres ainda é naturalizada na sociedade;
As ações de enfrentamento a feminização da AIDS são desarticuladas das outras políticas públicas, assim como a violência contra as mulheres;
Apesar da pressão do movimento de mulheres a rede de atendimento é falha na garantia de notificação dos casos de violência contra as mulheres.
Quais são os desafios para nós mulheres sobre a questão?
Aproximar o debate sobre AIDS no cotidiano das mulheres;
Construir ações integradas para o enfrentamento da feminização da AIDS e da Violência contra a mulheres nas áreas da saúde e da educação;
Desafio de desmistificar a naturalização da violência contra mulheres, pautá-la como fruto da subordinação e opressão do sistema patriarcal;
Ampliar e divulgar a rede de atendimento e garantir a notificação dos casos de violência contra mulheres;
Desafio de garantir a efetivação da laicidade do Estado;
Garantir a aplicação da Lei Maria da Penha;
Efetivar ações de cuidado em relação à saúde mental das mulheres vivendo com HIV;
Desafio de pautar a discussão da feminização da AIDS para além da heteronormatividade, assim como garantir a discussão dos direitos sexuais e direitos reprodutivos.
AIDS e condições de vida das mulheres: moradia, trabalho e renda

O QUE PENSAMOS SOBRE A AIDS CONDIÇÕES DE VIDA DAS MULHERES: Moradia, Trabalho e Renda?

A AIDS é um problema social e não apenas de saúde. Debilita o corpo, mas também a vida social das mulheres. Se elas estão em situação de pobreza, a vivencia da soropositividade para HIV/AIDS ainda é mais agravante porque estão com uma doença que carrega estigmas e preconceitos na sociedade, além de estarem sem moradia, sem renda e sem qualificação profissional;
O Programa Minha Casa, Minha Vida insere as trabalhadoras domésticas, trabalhadoras do sexo, moradores/as de rua e pessoas vivendo com HIV/AIDS como um dos públicos prioritários, mas isso não é cumprido na maioria dos Estados. O que vemos é uma grande quantidade de moradoras/es de rua que vivem com HIV/AIDS;
Compreendemos que temos avanços no campo da política de saúde, entre eles: atendimento médico para pessoas que vivem com AIDS, medicamentos (embora por vezes há desabastecimento de alguns remédios), apesar destes avanços faltam básico alimentação, muitas mulheres vivendo com HIV/AIDS passam por dificuldade em relação a adesão ao tratamento porque não tem alimentação básica e ou a recomendada;
A maioria das mulheres vivendo com HIV/AIDS não tem autonomia econômica, são dependentes do companheiro que, por sua vez, muitas vezes não recebem nem eles não chegam a receber um salário mínimo. Quando o mesmo vai a óbito a situação econômica se agrava ainda mais porque o INSS não beneficia que nunca trabalhou. Algumas têm dificuldades e ou incapacitadas de trabalhar, mas as que podem se deparam com o preconceito do mercado trabalho em admitir uma mulher soropositiva para HIV/AIDS;
A trabalhadora doméstica quando se descobre com HIV/AIDS, na maioria das vezes recebe demissão imediata, a maioria das/os empregadores não quer uma mulher com AIDS em sua casa. Algumas vezes as/os advogadas/os solicita à justiça a reintegração no trabalho, o empregador/a paga os benefícios, mas não a aceitou de volta. Outra situação muito frequente é no exame admissional obrigatório, quando descobre que a candidata tem HIV/AIDS ela não é admitida, mesmo sendo contra lei exigir o teste HIV. Mesmo quando passam e ou continuam trabalhar na residência, ficam em ambiente restrito, o que reforça ainda mais o preconceito;
A falta de recurso também dificulta a mobilidade das mulheres, principalmente as com HIV/AIDS que por muitas vezes por falta de recurso financeiro para as passagens não realizam o tratamento médico, por exemplo;
Nos sertões brasileiros não se fala em AIDS, não há divulgação divulgações sobre os serviços, sobre diagnóstico. Esta epidemia não aparece é invisível porque discriminação é muito grande, principalmente nas cidades pequena. A população na maioria das vezes quando ouve falar sobre AIDS é através de ONGs
O desmantelamento da política de assistência social dificulta a garantia do acesso na política de assistência social;
As mulheres são responsabilizadas pelo seu tratamento e ou pela não adesão aos medicamentos, também pelo dos filhos/as. Caso não saia como esperado elas são culpabilizadas, diferentes dos homens a quem não são delegados estas responsabilidades;
A interiorização da epidemia da AIDS já existe a muito tempo, mas o que falta é a execução das políticas públicas localizadas nos municípios do interior;
Há pouco diálogo e articulação política entre a universidade, movimentos sociais e comunidade sobre o enfrentamento a epidemia da AIDS.
Quais os desafios para nós mulheres sobre a questão discutida?

Precisamos focar a feminização da AIDS como uma questão social e não apenas como questão de saúde;
Precisamos incluir em nossas lutas a adesão ao tratamento articulado a exigências de políticas públicas (moradia, trabalho, educação, transporte, entre outras) que estruturem a qualidade de vida das mulheres vivendo com AIDS;
Inclusão do debate articulado com outros movimentos sociais à incidência política a importância das mulheres soropositivas no programa de moradia e do acesso ao passe livre;
Reforçar o debate sobre a epidemia da AIDS entre as mulheres jovens. Pressionar a política de educação;
Desconstruir a cultura machista que contribui para desresponsabilizar os homens da prevenção ao HIV/AIDS;
Fortalecer o debate contra a ilegalidade da exigência do teste HIV para admissão de trabalho e ou concursos públicos principalmente no campo do trabalho;
Realizar audiências públicas com parlamentares para pautar nossas propostas para o enfrentamento a feminização da AIDS;
Construir aproximação do debate sobre a feminização da AIDS com a universidade.
VIVÊNCIA DA AIDS E A ORGANIZAÇÃO POLÍTICA DAS MULHERES.

O QUE PENSAMOS SOBRE A VIVENCIA DA AIDS E A ORGANIZAÇÃO POLÍTICA DAS MULHERES

Nós mulheres somos sujeitos políticos em diferentes espaços políticos e geográficos e este lugar político que hoje ocupamos fora fruto de muita luta, participação e construção política, não foi um lugar “dado”, mas sim conquistado ao longo das ultimas décadas, enfocando também os avanços e desafios na luta contra a AIDS neste período;
As questões do HIV/AIDS devem ser pensadas e compreendidas para além do campo da saúde, incluindo reflexões sobre questões sociais, raciais, políticos e culturais que perpassam e encontram-se imbricados a discussão;
A construção de uma identidade mais política e de incidência social nas esferas de lutas por direitos desconstrói o discurso de vitimização;
As sociedades através de suas estruturas racistas, classistas, patriarcais e excludentes geram isolamento social e preconceitos fazendo com que o HIV/AIDS tenha raça, classe, gênero no Brasil;
Compreendemos como avanço a Política Nacional de Enfrentamento a Feminilização da AIDS;
Quais os desafios para nós mulheres sobre a questão discutida?
Processo de Formação Política das Mulheres englobando três esferas centrais: informação, conhecimento e empoderamento;
Enfrentar as novas configurações da epidemia no que tange principalmente as mulheres casadas;
Pautar as lutas junto a outros movimentos sociais e redes;
Respeitar as pessoas que não desejam falar publicamente que são portadoras do vírus, mas entendendo que a visibilidade política e social é fundamental para o processo de luta por direitos;
Discutir uma formação profissional pautada nos direitos humanos, que ampliem concepções para atender/acolher de forma humanizada e ética questões como aborto, HIV/AIDS, Homoafetividade, Sexualidade, Maternidade entre outros;
Pautar a Criação de Lei contra o desacato do usuários/as do SUS, assim como cobrar atendimentos e posturas éticas no atendimento em saúde fortalecendo dispositivos de punição para profissionais com posturas antiéticas que amparem os direitos dos usuários/as.

RELAÇÕES FAMILIARES E EPIDEMIA DA AIDS – AFETOS E CONFLITOS

O que pensamos sobre Relações Familiares e Epidemia da AIDS: afetos e conflitos?

A família ainda vista como lugar do privado e pouco dito, sem a concepção de que o privado é político;
Pobreza, classe social e raça são elementos fundamentais para enxergar o avanço da epidemia da AIDS.
A família é espaço para trabalhar tudo, inclusive o cuidado, mas muitas mulheres têm vergonha de expor sua sorologia para família, por medo, preconceito, discriminação e desconhecimento. Por exemplo, medo de contar que vive com AIDS para pai e mãe e ser colocada para fora;
Na família o campo do afeto ainda é muito da maternagem, há muitos conflitos com a figura e papel dos pais;
A vivencia da AIDS é revelada, na maioria das vezes, por pessoas de maior afeto;
Há muitas relações de opressão dentro de casa. A Participação em grupos oportuniza mudança na dinâmica familiar;
Há Relações de opressão dentro de casa. A violência familiar, a maioria das vezes, é praticada por todos e todas. É necessário rever as relações com o mundo;
Homossexualidade vista como falha da família;
A descoberta da soropositividade para HIV, trás a necessidade de maior apoio, mas muitas vezes os amigos/as se afastam. Aumenta a vontade de viver, principalmente por causa das/os filhas/os.

OS DESAFIOS PARA NÓS MULHERES SOBRE AS QUESTÕES DISCUTIDAS?

Trabalhar em nossos estados a influencia nas políticas públicas voltadas para a saúde da mulher, criando mecanismos para que essas políticas sejam implementadas, fiscalizando os órgãos responsáveis;
Um grande desafio é trabalhar a família como suporte, além de questões sobre: medo da morte, violação de direitos, nos serviços, especialmente os de saúde, falha médica nas orientações, especialmente às mulheres;
É necessário pautar epidemia da AIDS como assunto das donas de casa;
Orientar crianças e adolescentes para a prevenção;
Políticas de financiamento e doação;
Lutar por direitos, por ARV, por medicamentos para infecções oportunistas, por exames, por benefícios;
Fortalecer o Movimento Nacional das Cidadãs Posithivas;
Diminuir a hipocrisia de frentes que só querem visibilidade e poucos fazem pelas pessoas com AIDS, principalmente pelas mulheres;
Acesso aos direitos e exercício da cidadania;
Os movimentos sociais precisam traçar estratégias de aproximação de agendas para fortalecer pautas;O movimento de luta contra AIDS transita e precisa transitar em todos os campos.

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Relatório feito por Simone Freitas, da ONG SOS Corpo e Coordenadora do
Seminário.
Nós participamos do mesmo como Assessoria técnica do Grupo ASQV.
Miriam Fialho

quarta-feira, 21 de dezembro de 2011

VII FORUM UNGASS



Carta Política do VII FORUM UNGASS AIDS BRASIL
Recife – Pernambuco, 2011

Realizado nos dias 23 e 24 de outubro de 2011 com a participação de 84 representantes de Redes de Pessoas Vivendo com HIV e AIDS, Movimento Nacional das Cidadãs Posithivas, Rede Nacional de Jovens Vivendo com HIV e AIDS, Organizações LGBT, Parceria Brasileira Contra Tuberculose, Observatório Latino de Tuberculose, ONG/AIDS, Fóruns de ONG/AIDS e Rede GAPAS Brasil o VII Fórum UNGASS AIDS Brasil propiciou um importante momento de reflexão sobre os contextos global, regional e nacional de respostas ao HIV e à AIDS, explorando um maior diálogo entre estes níveis que, apesar de diversos, apresentam importantes pontos de convergência.
Os desafios globais e regionais, dez anos após a Declaração de Compromissos para superar a AIDS firmada nas Nações Unidas em 2001, estão mais complexos e a epidemia segue impulsionada por uma combinação explosiva de iniqüidades sócio-econômicas, violência de gênero e recorrentes violações dos Direitos Humanos, especialmente dos direitos sexuais. A situação atual, porém, é muito mais adversa, e as metas da recém-aprovada Declaração 2011 “Intensificar os Esforços para Eliminar a AIDS”, demandam acompanhamento técnico e político mais constante, uma vez que enfrentar o HIV e AIDS não é mais uma prioridade para os governos, agências de cooperação[1] e, claramente, não ocupa mais lugar na agenda de prioridades do governo brasileiro.
Diante de tal cenário, identificamos como maior desafio garantir as condições para o fortalecimento das organizações do Movimento Nacional de Luta Contra a AIDS para que possamos atuar local e globalmente com estrutura adequada e de forma articulada, influenciando os espaços decisórios das políticas públicas. As diversas vozes deste histórico movimento são cada vez mais necessárias para cobrar de gestores(as) e parlamentares que barrem posições fundamentalistas e cumpram seu papel de defesa de um Estado verdadeiramente laico, impedindo a violação dos direitos sexuais e direitos reprodutivos de todas as pessoas, particularmente gays e meninas jovens; punindo a perseguição e morte de transexuais e travestis, profissionais do sexo e defensores(as) de direitos humanos e apoiando as organizações sociais que, legitimamente, defendem a agenda de um desenvolvimento humano sustentável. O fortalecimento de um Estado laico e equitativo é vital para banir a cultura de discriminação e preconceito contra a população LGBT, contra as pessoas pobres e as pessoas negras no Brasil, especialmente se estas também vivem com HIV e AIDS.
Outro grande desafio a ser superado na agenda global/regional para a saúde pública é que a epidemia de AIDS ocorre num contexto de privatização de outras áreas estratégicas como educação, produção de energia, transporte, comunicação e segurança: a disputa entre os bens públicos e privados está no centro das questões que demandam urgente atenção – exemplo recente é o Decreto nº 7.508 (22/06/2011)[2], que fere os princípios da integralidade, universalidade, igualdade do SUS.
Diante de um contexto grave e de grandes mudanças na geopolítica mundial, nos preocupa ainda que os interesses de alguns poucos países e das corporações de comércio estejam enfraquecendo as legítimas instâncias multilaterais e forçando o retrocesso de direitos já conquistados, apoiados por culturas políticas ainda baseadas em relações que buscam vantagens financeiras, pessoais e partidárias e que, invariavelmente, resultam em alto nível de corrupção. Assim, avaliamos que o governo brasileiro deva continuar e fortalecer seu papel atuante na defesa da saúde global, garantindo, por exemplo transparência e participação social na atual reforma da Organização Mundial de Saúde.
Nacionalmente nos preocupa também a debilidade das ainda poucas políticas inter-setoriais e a grande dificuldade em implementar sistemas de informação articulados, que garantam a qualidade do monitoramento e avaliação dos serviços e políticas de saúde. Finalmente, nos inquieta observar a grande crise de liderança nas esferas governamentais global e localmente – é fato que no Brasil muitos gestores(as) ainda carecem de capacidade técnica e habilidade política para erradicar a AIDS, o que demanda urgente atenção por parte do Ministério da Saúde.
Portanto, é num contexto de múltiplos desafios que reafirmamos:
• Que as intervenções para superar o HIV e AIDS devem basear-se na compreensão de que saúde pública é um direito humano, e que os serviços públicos devem ser, ao mesmo tempo de qualidade e efetivos. Para que isso ocorra é fundamental garantir estratégias inovadoras, com ações multisetoriais, fortalecer o controle social e, de maneira urgente, garantir a efetividade das estruturas de controle institucional já previstas na Constituição Federal.
• A defesa da garantia da eficácia plena e responsabilidade administrativa na gestão pública das políticas sociais, garantindo que os instrumentos de proteção social – principalmente nos campos da saúde, direitos humanos e desenvolvimento– não sejam tratados como bens de consumo privado, aos quais poucos acessam.
• Que o avanço da agenda de direitos humanos para responder à AIDS no Brasil está diretamente relacionado a processos decisórios criados a partir da construção coletiva, de forma transparente e com a participação efetiva do movimento de luta contra a AIDS no desenho, alocação de recursos, monitoramento e avaliação das políticas públicas federais, estaduais e municipais.

Assim, solicitamos ao Ministério da Saúde:

• A inclusão de indicadores qualitativos nas estratégicas de monitoramento, coleta de dados e avaliação das ações, programas e serviços de saúde no país;
• Um diagnóstico nacional atualizado sobre a situação das crianças vivendo com o HIV e AIDS – consideramos grave a ausência de dados relevantes sobre esta população que demanda melhores estratégias de acesso e acolhimento;
• A criação de um programa efetivo de Prevenção Posithiva, para melhorar a qualidade de vida das Pessoas Vivendo com HIV e AIDS (PVHA), focado na adesão ao tratamento do HIV e AIDS e da coinfecção pela Tuberculose, com estratégias que garantam às PVHA acesso e acolhimento de qualidade pela rede de apoio;
• Aumento dos esforços para enfrentar a tuberculose, melhorando a prevenção, o diagnóstico precoce e o seu tratamento e integrando os serviços de HIV e TB, de acordo com o Plano Global para deter a TB (2011-2015), com os Objetivos do Milênio e com a Declaração “Intensificar os Esforços para Eliminar a AIDS”, todos ratificados pelo Brasil;
• Maior ênfase na articulação e atenção dos governos estaduais e municipais e maiores recursos destinados ao Plano Nacional de Enfrentamento da Epidemia da AIDS e DST entre Gays, outros Homens que fazem Sexo com Homens e Travestis e o Plano Nacional Integrado de Enfrentamento à Feminização da Epidemia da Aids e outras DST ; assim como o cumprimento da Portaria de Lipodistrofia[3] na sua integralidade;
• Maior investimento nacional em pesquisa e desenvolvimento de produtos e insumos para prevenir, diagnosticar e tratar o HIV e AIDS. Inclusive vacinas terapêuticas para as PVHA;
• Estabelecimento de diálogo e mecanismos transparentes para acompanhar os processos de produção, compra e distribuição de ARV (antiretrovirais), disponibilizando informações detalhadas e atualizadas sobre: a) o cumprimento de entregas por fornecedores e estado dos estoques. b) os critérios de adoção e financiamento de Parcerias Público-Privado, acordos de transferência de tecnologia em negociação para produção nacional de ARV, no âmbito da política que estabelece o Complexo Industrial da Saúde; c) determinantes do preço de ARV, risco de criação de demandas e desabastecimentos decorrentes da criação de monopólio temporário.
• Solicitamos a incorporação[4] e uso das flexibilidades de proteção da saúde publica prevista no acordo TRIPS da OMC que possibilitam a aquisição de medicamentos a preços acessíveis e enfrentem práticas monopolistas das empresas farmacêuticas, incluindo além do uso da licença compulsória, exceção Bolar e outras alternativas, o re-estabelecimento da Anuência Prévia da ANVISA. Ademais, que sejam impedidas a adoção de medidas de tipo TRIPS-plus nas esferas Legislativa, Judiciária e Executivo, mantendo assim coerência com a posição do governo brasileiro que defende em foros internacionais a proteção da saúde publica frente a interesses comerciais.
• Engajamento nos processos e debates para criação de taxas sobre transações financeiras internacionais, atualmente em discussão pelo G20, para que estas sejam também utilizadas para a Saúde;
• Cobrança imediata do Ministério da Saúde e Ministério Público junto a gestores (as) de saúde para alocação e gasto transparente e efetivo dos recursos. Consideramos ato criminoso que R$ 139.000.000,00 (centro e trinta e nove milhões de reais) transferidos pela política de Incentivo Fundo a Fundo a ações de assistência as PVHA e prevenção ao HIV e AIDS estejam parados nos cofres públicos de estados e municípios. Demandamos apuração imediata do caso e punição dos responsáveis.


Solidariamente,

VII Fórum UNGASS-AIDS Brasil

AGÁ & VIDA – AC
Antonio da Silva Morais - Ativista
Articulação AIDS em Pernambuco
Associação Brasileira de Lésbicas, Gays, Bissexuais, Travestis e Transexuais – ABGLT
Associação Grupo Ipê Amarelo Pela Livre Orientação Sexual – GIAMA
Associação de Luta Pela Vida – RR
Associação Katiró – AM
Cristina Guedes - Ativista
Danielle Neves A. de Almeida - Ativista
Espaço Saúde - SP
Federação dos Bandeirantes do Brasil – RS
Felipe de Almeida Travassos – Ativista
Fórum de Mulheres de Pernambuco
Fórum de ONG/AIDS de São Paulo
Fórum Paranaense de ONG/AIDS
Fórum de ONG/TB/RJ
GAPA/BA
GAPA/PA
GAPA/SP
GAPA/RS
GAPP e HIV e AIDS/MS
GESTOS – Soropositividade, Comunicação e Gênero
GRUPAJUS
Grupo Apoio a Diversidade (GAD)
Grupo Cactos/PE
Grupo de Amigos na Luta Contra SIDA, Pela Qualidade de VIDA – ASQV/PE
Grupo de Resistência Asa Branca
Grupo Pela Vidda/GO
Grupo Pela Vidda/RJ
Grupo Solidariedade É Vida
IBISS
ICW Brasil – Comunidade Internacional de Mulheres Vivendo com HIV e AIDS
Instituto Vida Nova Int. Soc. Ed. E Cidadania – SP
Jerônimo Duarte Ribeiro - Ativista
José Cândido – Ativista
José Costa da Silva - Ativista
José Marcos Oliveira – Rep. do Movimento de AIDS no Conselho Nacional de Saúde
Juliandro César de Lima – Ativista
Lindalva Maria de Lima – Ativista
Lucineide da Silva Santana - Ativista
Maria José da Silva - Ativista
Movimento Nacional das Cidadãs Posithivas – AL
Movimento Nacional das Cidadãs Posithivas - Bahia
Movimento Nacional das Cidadãs Posithivas – CE
Movimento Nacional das Cidadãs Posithivas - MA
Movimento Nacional das Cidadãs Posithivas – Nordeste
Movimento Nacional das Cidadãs Posithivas – Ponta Porã/MS
Movimento Nacional das Cidadãs Posithivas – Rio Grande do Norte
Movimento Nacional das Cidadãs Posithivas - Sergipe
Movimento Popular de Saúde de Sergipe
Natasha Dumhom - Ativista
Observatório Tuberculose
Parceria Brasileira de Luta Contra Tuberculose (STOP TB Brasil)
Paulo Roberto Giacomini - Ativista
PROJESP
Rede Latino Americana de Pessoas Vivendo com HIV e AIDS – Brasi
Rede Nacional de Pessoas Trans
Rede Nacional de Jovens Vivendo com HIV e AIDS Brasil
RNP+ Bahia
RNP+ Núcleo Ceará
RNP+ Núcleo Médio Paraíba – RJ
RNP+ Núcleo Mato Grosso do Sul
RNP+ Núcleo Paraná
RNP+ Núcleo Pernambuco
RNP+ Núcleo Rio de Janeiro
Sandra Maria da Silva Beltrão – Ativista
Secretaria Nacional da RNP+ Brasil
Vanderlúcia Torres da Silva – Ativista
Missão Nova Esperança/PB




[1] Em 2010 registrou redução dos recursos aplicados para enfrentar a epidemia globalmente de 10%.Unaids e Kaiser Foundation Reports.
[2] Que regulamenta a lei federal nº 8080/90, a lei do SUS.
[3] Portaria nº 2.582/GM, de 2 de dezembro de 2004, que inclui cirurgias
reparadoras para pacientes portadores de Aids e usuários de Anti retrovirais.
[4] Pelos Supremo Tribunal Federal, Instituto Nacional da Propriedade Industrial, Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior, Ministério da Saúde e Congresso Nacional