quinta-feira, 24 de novembro de 2011

A ARTE DE DAR...

"Na esfera das coisas materiais, dar significa ser rico. Não é rico quem muito tem, mas quem muito dá. O ávaro que ansiosamente receia perder alguma coisa é, psicologicamente falando, o homem pobre, empobrecido, não importa quanto possua. Quem é capaz de dar de si é rico. Põe-se à prova como quem pode conceder de si aos outros. Só quem for privado de tudo quanto vá além das mais simples necessidades da existência será incapaz de gozar o ato de dar coisas materiais. Mas, a experiência diária mostra que aquilo que alguém considera como necessidades mínimas depende tanto de seu caráter quanto de suas posses efetivas. É bem sabido que os pobres são mais inclinados a dar do que os ricos. Não obstante, a pobreza além de certo ponto pode tornar impossível dar, e assim é degradante, não só pelo sofrimento que causa diretamente, mas pelo fato de privar o pobre da alegria de dar.

A mais importante esfera de dar, entretanto, não é a das coisas materiais, mas está no reino especificamente humano. Que dá uma pessoa a outra? Dá de si mesma, do que tem de mais precioso, dá da sua vida. Isto não quer necessáriamente dizer que sacrifique sua vida por outrem, mas que lhe dê daquilo que em si tem de vivo; de-lhe de sua alegria, de seu conheciemnto, de seu humor, de sua tristeza - de todas as expressões e manifestações daquilo que vive em si. Dando assim de sua vida, enriquece a outra pessoa, valoriza-lhe o sentimento de vida da outra pessoa, valoriza-lhe o sentimento de vitalidade ao valorizar o seu próprio sentimento de vitalidade. Não dá a fim de receber; dar é, em si mesmo requintada alegria. Mas, ao dar, não pode deixar de levar alguma coisa à vida da outra pesoa, e isso que é levado à vida reflete-se de volta no doador; ao dar verdadeiramente, não pode deixar de receber o que lhe é dado de retorno. Dar implica fazer da outra pessoa também um doador e ambos compartilham da alegria de haver trazido algo à vida. No ato de dar, algo nasce, e ambas as pessoas envolvidas são gratas pela vida que para ambas nasceu. Com relação ao amor, isso significa que: o amor é uma força que produz amor.

Quase não é nessário acentuar o fato de que a capacidade de dar depende do desenvolvimento do caráter da pessoa. Pressupõe o alcançamento de uma orientação predominantemente produtiva; nessa orientação a pessoa superou a dependência narcisista, o desejo de explorar os outros, ou de amealhar, e adquiriu fé em seus próprios poderes humanos, coragem de confiar em suas forças para atingir seus alvos. No mesmo grau em que faltarem essas qualidades é ela temerosa de dar-se - e, portanto, de amar..."
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Texto trancrito do Livro A Arte de Amar.
Páginas: 46 a 48
Autor: Erich Fromm
Editora Itatiaia Limitada, 1986 - Belo Horizonte
Vale a pena conferir, mesmo que a publicação seja antiga. Acho que deve ter uma edição mais atualizada.

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